Senado aprova autonomia formal do Banco Central

O Plenário do Senado aprovou nesta terça-feira (3/11) o substitutivo do senador Telmário Mota (Pros-RR) ao Projeto de Lei Complementar (PLP) 19/2019, do senador Plínio Valério (PSDB/AM), que estabelece mandatos estáveis e requisitos para nomeação e demissão do presidente e dos diretores do Banco Central. Foram 56 votos a favor e 12 contrários. O projeto segue agora para análise da Câmara dos Deputados e pode voltar ao Senado caso os deputados façam alterações no texto.

A presidência do Banco Central, hoje ocupada pelo economista Roberto Campos Neto, e os outros oito integrantes da diretoria colegiada são indicados pelo presidente da República e passam por sabatina e aprovação no Senado Federal. Mas o Executivo pode demiti-los quando quiser, sem precisar de justificativas. Esse é o principal ponto a ser alterado pelo PLP 19/2019 – Complementar. Ao estabelecer um mandato fixo para os diretores, o BC ganha autonomia formal em relação ao governo federal. Entre as alterações do substitutivo aprovado, há a determinação de que o Conselho Monetário Nacional (CMN) estabeleça as metas para a política monetária, cabendo ao Banco Central o cumprimento dessas metas.

Os mandatos da diretoria serão de quatro anos, com uma recondução permitida, e a dispensa de um diretor antes do fim do período só seria possível em casos de condenação judicial ou desempenho insuficiente. Nessa última hipótese, o Senado precisaria concordar com a decisão.

O texto diz que o presidente e os diretores deverão ser nomeados em 1º de janeiro do terceiro ano de mandato do presidente da República em exercício. Portanto, no governo de Jair Bolsonaro, seria no início de 2021. O senador Plínio Valério e o relator, Telmário Mota (Pros-RR), inseriram uma emenda que prevê que, como já estão nos cargos, Roberto Campos Neto e seus diretores não precisarão passar por todo o processo de indicação novamente, sendo apenas nomeados. No caso de Campos, seu mandato será fixado até 31 de dezembro de 2024.

O texto do PLP admite a recondução para o presidente e para os diretores do Banco Central do Brasil “que houverem sido nomeados na forma prevista neste artigo”. Assim, Campos, se reeleito, poderá conduzir o BC por mais quatro anos, até 31 de dezembro de 2028, totalizando 9 anos e 10 meses. Ele seria o presidente do BC a exercer o cargo por mais tempo desde que a instituição foi criada, em 1965.

Também consta que o BC passará a ser uma “autarquia de natureza especial”, não se subordinando a nenhum ministério. Pelo substitutivo, o BC estará no mesmo nível dos ministérios, devendo atender às normas que disciplinam todos os sistemas da Administração Federal. O substitutivo aprovado atualiza as competências privativas do BC, previstas na Lei 4.595. de 1964,  permitindo que o BC aprove seu próprio regimento interno e efetue , como instrumento de política cambial, operações de compra e venda de moeda estrangeira e operações com instrumentos derivativos no mercado interno.

Para o economista Bruno Moretti, o BC não deveria atuar com autonomia em relação ao governo federal, principalmente num contexto de crise econômica, quando o governo precisa usar instrumentos monetários e fiscais combinados para estimular a retomada do crescimento e a geração de emprego e renda. Por isso, para ele, a proposta não deveria ser aprovada.

“Não concordo com a tese de que é preciso se livrar das influências políticas para que o Banco Central desempenhe adequadamente a sua função. Na verdade, esse conceito de autonomia do Banco Central é um conceito falso, ele não será um Banco Central autônomo, haverá um risco muito grande de captura da política monetária pelas pressões de mercado, e é isso que me preocupa e me faz ser contrário à autonomia, precisamente o risco que há de captura do Banco Central e da política monetária pelo mercado”, disse em entrevista à Agência Senado.

Moretti explicou que o Bacen operando em harmonia com o Tesouro Nacional é fundamental para não ceder a pressões do mercado, e a autonomia em relação ao governo eleito, seja ele qual for, pode causar dificuldades de coordenação dos esforços de política econômica e fiscal para promover o crescimento econômico.

O economista acrescentou que não adianta comparar o Brasil com outros países desenvolvidos com bancos centrais autônomos (Japão e Estados Unidos, além da União Europeia), já que o momento em que isso foi feito por lá é totalmente distinto do que os brasileiros vivem agora, de crise.

“O momento atual é dos BCs passarem a usar instrumentos de política econômica não convencionais. Ou seja, as taxas de juros já estão muito baixas, você precisa atuar com outras políticas para estimular a retomada da economia, com o lado monetário. São as chamadas políticas de afrouxamento monetário. O momento do mundo é de integrar os BCs ao esforço de reconstrução da economia, não de fazer um BC autônomo e com mandato único”, completou.

Propostas que dão autonomia ao Banco Central para executar a política monetária (determinar a quantidade de moeda em circulação, a oferta de crédito e as taxas de juros na economia brasileira para controlar a inflação) estão em discussão no Congresso Nacional desde a década de 1990 e nunca se chegou a um consenso para aprová-las.

 

Segunda onda mete medo e o desemprego avança

A segunda onda de coronavírus assombra o mundo. Na Europa novamente bloqueios, lockdown e manifestações contrárias ao novo fechamento da economia. A Organização Mundial da Saúde (OMS) informou que as mortes diárias por Covid-19 em território europeu aumentaram quase 40% na última semana.

De certa forma, a segunda onda já era razoavelmente esperada depois das grandes reaberturas na Europa. No Brasil ainda estamos na primeira onda, mas com número de mortos próximo dos 500 por dia, patamar considerado ainda muito alto. Mesmo assim, o comércio, serviços, cinemas, shoppings estão abrindo porque não tem como mantê-los fechados por mais tempo, com o risco de não abrirem mais. Esta já é uma realidade e basta olhar o número de estabelecimentos fechados por todas as cidades. Uma segunda onda no Brasil será devastadora.

Isso faz crescer incerteza em relação ao andamento da atividade econômica no Brasil para os próximos meses. Economistas reiteram necessidade de planejamento mais confiável, por parte do Ministério da Economia, para lidar com a atual crise. Recentemente, numa sessão temática semipresencial no Plenário do Senado, sobre o cenário atual, participantes afirmaram que a crise sanitária demonstrou a disfuncionalidade das regras fiscais brasileiras.

Na opinião de economistas convidados, o engessamento do orçamento em função do teto de gastos não é adequado para momentos de crise. Eles demonstraram apoio à proposta (PEC 36/2020) do senador Rogério Carvalho (PT-SE), que cria regras fiscais mais flexíveis, especialmente para educação e saúde.

Setor formal afetado

O choque inicial do novo coronavírus tornou real uma situação extrema em que a maior parte das ocupações informais foi paralisada por um longo período, devido à quarentena e ao isolamento social. Agora, o setor formal passou a responder pela maior parte das ocupações perdidas no país no trimestre móvel encerrado em agosto, conforme dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua Mensal (PNAD Contínua), divulgados nesta sexta-feira, 30/10, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

De acordo com o IBGE, o país perdeu 4,27 milhões de ocupações no trimestre móvel até agosto, frente aos três meses anteriores. Desse total, três milhões eram empregos com carteira assinada ou ocupações formais, como CNPJ, como empregadores e autônomos, o correspondente a 71% dos postos fechados.

A taxa de desemprego chegou a 14,4% no trimestre de junho a agosto de 2020 foi a mais alta da série histórica iniciada em 2012, crescendo 1,6 ponto percentual em relação ao trimestre anterior (12,9%). O número de desempregados chega a de 13,8 milhões de pessoas, que representa um aumento de 8,5%, ou mais 1,1 milhão de pessoas, frente ao trimestre móvel anterior (12,7 milhões) e subiu 9,8% (1,2 milhão de pessoas a mais) em relação mesmo trimestre de 2019 (12,6 milhões).

A população ocupada de 81,7 milhões, a menor da série, caiu 5% (menos 4,3 milhões de pessoas), em relação ao trimestre anterior e 12,8% (menos 12 milhões de pessoas), frente ao mesmo trimestre de 2019. O nível de ocupação de 46,8%, também foi o mais baixo da série, caindo 2,7 pontos percentuais frente ao trimestre anterior e de 7,9 pontos percentuais contra o mesmo trimestre de 2019.

Um dos poucos otimistas com a situação atual é o ministro Paulo Guedes. “A doença está descendo, a economia está voltando, e está voltando em ‘V’, a criação de empregos está se dando a um ritmo bastante impressionante”, disse ele.

Atividades em queda

Frente ao trimestre móvel anterior, a população ocupada diminuiu em oito dos dez grupamentos de atividades analisados pela PNAD Contínua:

Indústria: 3,9%, ou menos 427 mil pessoas;

Comércio, reparação de veículos automotores e motocicletas: 4,7%, ou menos 754 mil pessoas;

Transporte, armazenagem e correio: 11,1%, ou menos 507 mil pessoas

Alojamento e alimentação: 15,1%, ou menos 661 mil pessoas;

Informação, Comunicação e Atividades Financeiras, Imobiliárias, Profissionais e Administrativas: 3,3%, ou menos 337 mil pessoas;

Administração pública, defesa, seguridade social, educação, saúde humana e serviços sociais: 4,4%, ou menos 740 mil pessoas;

Outros serviços: 11,6%, ou menos 510 mil pessoas;

Serviços domésticos: 9,4%, ou menos 477 mil pessoas;

 

União Europeia garante recursos para recuperar economia da região

A exemplo do que ocorreu em muitas partes do mundo, a pandemia da Covid-19 afetou os países da União Europeia de forma sem precedentes, com a rápida transformação da emergência sanitária em uma crise econômica de grandes proporções. As estimativas sugerem que economia da Bloco pode encolher mais de 7% em 2020, com recuperação parcial em 2021. Agora, com o agravante de registros de mais contágios por semana do que durante o primeiro pico da pandemia.

Os europeus, ao contrário do governo Bolsonaro, saíram na frente ao desenhar um ambicioso e abrangente plano de reativação de sua economia, associando objetivos de curto prazo, como o aumento do emprego e o crescimento do PIB, a metas de longo prazo, como a construção de uma economia ambientalmente sustentável e o avanço da digitalização.

Uma reunião de líderes da União Europeia aprovou uma ajuda de 750 bilhões de euros para os países do bloco que tiveram mais prejuízos para a economia nessa pandemia. Serão 390 bilhões de euros na forma de doações e 360 bilhões emprestados a juros baixos.

A Carta do Instituto de Estudos Para o Desenvolvimento Industrial (IEDI) – que reúne atualmente 50 empresários representantes de grandes corporações brasileiras – apresenta os principais elementos do plano de recuperação da União Europeia.

Os programas e instrumentos que integram o Plano de Recuperação estão organizados em torno de três eixos:

O primeiro eixo consiste no apoio aos Estados-membros, após o choque da Covid-19. Como o investimento tem um papel vital a desempenhar para uma recuperação equilibrada e sustentável, mais de 98% dos recursos do Fundo NGEU – criado para ajudar os países da UE a fazer face à crise causada pela pandemia e reforça o tradicional Multiannual Financial Framework (MFF), o Quadro Financeiro Plurianual – será utilizado para apoiar o investimento estatal e as principais reformas estruturais nos Estados-membros.

A prioridade será daqueles países e/ou regiões onde o impacto da crise e as necessidades de resiliência são maiores. Integram este eixo, os programas Mecanismo de Recuperação e Resiliência (RRF), Assistência de Recuperação para a Coesão e os Territórios da Europa (ReactEU), Fundo Agrícola Europeu de Desenvolvimento Rural (EAFRD) e o Fundo para uma Transição Justa (JTF).

O segundo eixo tem como foco o relançamento da economia por meio do incentivo ao investimento privado, especialmente em setores e tecnologias essenciais, considerados estratégicos para garantir a competitividade a longo prazo da União Europeia. A Comissão propôs o reforço do InvestEU, o principal programa de investimento da Europa.

Na proposta do Plano de Recuperação encaminhada ao Conselho Europeu, esse 2º eixo também incluí o Instrumento Temporário de Apoio à Solvência, destinado a apoiar a reposição de capital das empresas viáveis em risco de insolvência em razão da crise. Porém, essa proposição não foi aprovada pelos líderes europeus, que preferiram reforçar o Mecanismo de Recuperação e Resiliência que integra o Eixo 1.

O terceiro e último eixo se concentra nas lições extraídas da crise. A pandemia sublinhou o valor da cooperação e evidenciou a necessidade de a União Europeia desenvolver com urgência a sua capacidade de resposta às crises e aumentar a resistência a choques futuros.

Por essa razão, o Plano de Recuperação prevê a alocação recursos adicionais para os programas que impulsionam o crescimento e fortalecem a cooperação e capacidade da Europa de resistir e superar crises futuras, casos do mecanismo de proteção civil da União Europeia RescEU e do Horizon Europe, que é o principal programa europeu de fomento à pesquisa e inovação.

Rede 5G deixa Governo Bolsonaro numa sinuca de bico

A visita da delegação do governo dos Estados Unidos ao Brasil esta semana, tendo como um dos integrantes o Conselheiro de Segurança Nacional dos Estados Unidos, Robert C. O’Brien, mostra o tamanho da pressão contra a China e a presença da Huawei no leilão da quinta geração de internet móvel, 5G. O leilão das faixas de espectro que serão utilizadas para a implementação da rede 5G no Brasil está previsto para acontecer no primeiro semestre de 2021.

Membros da comitiva foram firmes ao dizer que há alternativas aos fornecedores chineses e que o governo dos EUA está pronto para financiar empresas de telecomunicações brasileiras que queiram comprar equipamentos de rivais da potência asiática.

Na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) O’Brien externou preocupação com ataques cibernéticos recentes e ao crescente domínio chinês sobre essa esfera. “Estamos recomendando fortemente que nossos parceiros fechem acordos com fornecedores confiáveis”, alertou. “Temos uma longa história de cooperação com o Brasil nas áreas de segurança e defesa e podemos aperfeiçoar ainda mais essa parceria”, complementou.

Os EUA têm pressionado o Brasil a banir equipamentos chineses da infraestrutura da telefonia 5G, alegando que há risco de espionagem. Soa estranho o alerta depois das informações secretas obtidas pelo WikiLeaks, que revelam detalhes sobre a espionagem da NSA, sigla em inglês da Agência Nacional de Segurança, contra a presidenta Dilma Rousseff e assessores próximos, ministros e um integrante do Banco Central.

Além disso, o governo brasileiro instituiu o Plano Nacional de Internet das Coisas por meio do Decreto nº 9.854, de 25 de junho de 2019. A finalidade é implementar e desenvolver a internet of things (IoT) no Brasil, com base na livre concorrência e na livre circulação de dados e com observância das regras de segurança da informação.

Infraestrutura já existe

O governo Bolsonaro sabe da importância de implementar a infraestrutura para o 5G, que permitirá uma banda larga móvel de altíssima potência e qualidade com impacto no acesso ao conhecimento. A infraestrutura que já existe é um entrave real à pressão dos Estados Unidos contra a chinesa Huawei. Ela já atua há mais de 20 anos no Brasil e é uma das principais fornecedoras das operadoras de telecomunicações. Segundo dados da Anatel, a Huawei está presente em 35% da infraestrutura das redes de telefonia móvel de 2G, 3G e 4G do País, ficando atrás apenas da sueca Ericsson.

As marcas não fabricam equipamentos de infraestrutura compatíveis entre si. Estas antenas e estações não vão virar 5G com extensões de outras marcas. Portanto, não usar Huawei exigiria trocar também a rede 4G — ou implementar uma 5G do zero, o que aumentaria muitíssimo o preço.

A embaixada da China no Brasil distribuiu uma nota à imprensa sobre as declarações da comitiva dos EUA: “Alguns políticos norte-americanos inventaram recentemente mentiras políticas contra a China com um conceito de Guerra Fria e jogo de soma zero para criar uma teoria de ‘ameaça chinesa’ para pressionar o Brasil a reduzir sua dependência comercial com a China.”

Continua a nota: “China e Brasil são parceiros estratégicos globais. Ambos são membros do G20 e do grupo BRICS e compartilham interesses comuns amplos em muitos temas internacionais e regionais importantes. A China tem sido o maior parceiro comercial do Brasil há onze anos e é a maior fonte do superávit comercial do Brasil, além de um dos países com mais investimentos no país sul-americano.”

Também a Huawei distribuiu uma nota, onde afirma “que nunca teve nenhum grande incidente relacionado à segurança cibernética nos 170 países em que opera nas últimas três décadas. Há 22 anos no país, a Huawei tem no Brasil um histórico de produtos de alta qualidade e segurança cibernética.”

Estreita relação econômica

As notas dos chineses revelam a estreita relação econômica com o Brasil. A China é o principal importador de produtos brasileiros e respondeu por 40% das exportações agrícolas brasileiras no primeiro semestre deste ano, segundo levantamento realizado pela Secretaria de Comércio e Relações Internacionais do Ministério da Agricultura. De janeiro a junho deste ano, foram gerados US$ 20,5 bilhões com as vendas de produtos agrícolas para os chineses.

Em 2020 a participação da China nas exportações do agro foi recorde. O país compra do Brasil sobretudo soja em grão e carnes, mas a pauta inclui dezenas de produtos e a intenção da cadeia produtiva é ampliá-la cada vez mais. A China importou do Brasil, em 2019, US$ 63,36 bilhões, 28,1% do total, enquanto os Estados Unidos, US$ 29,72 Bilhões, 13,2%.

Em entrevista para “O Globo”, o embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Todd Chapman, já havia avisado que o país terá “consequências” econômicas negativas caso decida manter a Huawei no leilão do 5G. Para o diplomata, a presença da gigante chinesa de telecomunicações deve fazer com que empresas “baseadas na propriedade intelectual” evitem investir no Brasil.

O embaixador chinês no Brasil, Yang Wanming, também deu seu recado em entrevista para o jornal Valor Econômico, em julho passado: “A China não exercerá pressão, nem fará ingerência sobre nenhum país, na sua escolha do fornecedor do 5G. No entanto, somos contrários ao uso de meios administrativos para interferir na participação legítima de empresas chinesas na cooperação internacional ou na concorrência de mercado. A questão não é se a Huawei poderá ganhar ou não um determinado leilão. O que está em jogo é a capacidade e vontade de um governo criar um ambiente de negócios e regras de mercado dentro dos parâmetros de equidade, imparcialidade e não discriminação. Não se trata somente da preocupação de uma empresa em particular, como a Huawei, mas de um importante critério de avaliação das condições de um mercado, que tem impacto significativo nas decisões de investimento e operação de todas as empresas chinesas.”

Impacto difuso

Steve Jobs apresentou em janeiro de 2007 um novo modelo do iPhone ao mundo e muita coisa mudou no smartphone. Agora, o 5G extrapola o smartphone, com o novo conceito da a internet das coisas, onde a regra principal é que tudo o que puder ser conectado será conectado. Isso inclui itens que vão desde eletrodomésticos e meios de transporte até maçanetas de portas e peças de vestuário. No futuro, tudo estará conectado à rede mundial de computadores e poderá ser acessado por equipamentos cada vez mais sofisticados.

O Ministério da Economia calcula um impacto em aumento de produtividade de R$ 249 bilhões até 2035 com a chegada do 5G. Segundo a Associação Brasileira de Internet das Coisas (Abinc), quando comparado ao atual 4G, o 5G terá transmissão de dados 10 vezes mais rápida, latência 10 vezes menor, de 10 a 100 vezes mais dispositivos conectados e menor consumo de bateria, em termos gerais.

A latência mede quanto tempo leva um pacote de dados ir de um dispositivo ou servidor até outro dispositivo ou computador. Na média, a latência de uma rede 4G gira em torno de 50 milissegundos (ms). Já a latência prevista para as redes 5G é de 1 ms.

O relatório anual o Fórum Econômico Mundial sobre o futuro do trabalho, que mapeia os empregos e as habilidades do futuro, prevê que, até 2025, a automação irá eliminar 85 milhões empregos no mundo enquanto a nova divisão de trabalho, entre máquinas, humanos e algoritmos irá criar 97 milhões. Até agora, a destruição dos empregos foi infinitamente maior.

A fome aumenta no meio da pandemia

No mês de outubro, quando é celebrado o Dia Mundial da Alimentação (16), data instituída pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), cerca de 130 milhões de pessoas correm o risco de ficar à beira da fome até o final deste ano devido a pandemia do novo coronavírus. O tema de 2020 é “Crescer, Nutrir e Sustentar. Juntos”. Segundo dados da ONU, esse número se soma aos 690 milhões de pessoas que já não têm o que comer. Ao mesmo tempo, alerta a organização, mais de três bilhões de pessoas não têm dinheiro para fazer uma dieta saudável.

No Brasil, a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) do IBGE, mostra que 10,3 milhões de brasileiros passam fome, um aumento de três milhões de pessoas sem acesso normal a refeições em cinco anos. A conta não inclui pessoas em situação de rua.

Segundo o estudo, a insegurança alimentar grave no Brasil é registrada principalmente em áreas rurais: 23,3% da população urbana passam fome, enquanto 40,1% da população rural atravessam a mesma situação. O Brasil retornou ao Mapa da Fome – lista de países com mais de 5% da população ingerindo menos calorias do que o recomendável. Desde 2014 o país já havia deixado a lista.

Os governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro praticamente zeraram os estoques estratégicos de alimentos, imprescindíveis para compor as cestas. Por meio da Medida Provisória nº 870 (MP 870), editada pelo presidente Jair Bolsonaro em seu primeiro dia de governo, o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) foi extinto, fragilizando o funcionamento do Sistema de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan).

Os estoques estratégicos viabilizam um programa fundamental em momentos de crise: a Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM). Nos anos 2000, o arroz ocupava 3,2 milhões hectares de área plantada no Brasil; a estimativa para a safra atual é de 1,6 milhão de hectares, metade do que era plantado. O mesmo acontece na cultura do feijão (redução de 76,5%), conforme a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).

Já a soja, que ocupava 13,9 milhões de hectares há duas décadas, atingiu 36,9 milhões de hectares neste ano, expansão de 165%. Um dos principais produtos do país, não é armazenado desde 2013.

Lei Kandir

A redução da área de plantio de alimentos da cesta básica, com o consequente aumento da fome no Brasil, tem um componente pouco explorado pela mídia corporativa, que não quer brigar com o agronegócio: as exportações de grãos como a soja não pagam ICMS e se beneficiam com a forte desvalorização do real em relação ao dólar.

A PEC 42/2019, que tem como relator o senador Veneziano Vital do Rêgo (PSB-PB), revoga a isenção de ICMS na exportação de produtos não industrializados e semi-elaborados. Para Vital do Rêgo, suprimir a desoneração do ICMS prevista na Lei Kandir com uma Emenda constitucional é a única forma de restabelecer essa importante fonte de recurso aos Estados e Municípios, já que o Executivo não dispõe de poder de veto sobre as propostas de emenda. Desde outubro de 2019, a PEC 42/2019 está pendente de parecer da CCJ – Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado.

Estudo feito pelo Ibope e pelo Fundo de Emergência Internacional das Nações Unidas para a Infância (Unicef) aponta que nove milhões de brasileiros deixaram de comer pelo menos um dia nos últimos meses porque não tinham dinheiro para comprar alimentos. Nesse mesmo Brasil, 40 mil toneladas de alimentos são desperdiçadas por dia e vão para o lixo.

A revolução Pix

O Pix – Sistema Brasileiro de Pagamentos Instantâneos – começa a operar em 16 de novembro. Muito mais rápido e simples, o serviço controlado pelo Banco Central (BC) poderá ser usado por quem possui uma conta bancária. Com o Pix é possível transferir e pagar contas à vista em tempo real, sem custos para pessoa física e sem restrições de dias ou horários. No entanto, o Pix é parte de algo muito maior.

Para revolucionar um mercado de pagadores e recebedores pelas transações, como acontece com DOCs e TEDs, nas mãos de poucos competidores, o BC concentrou o Pix na própria instituição, como único provedor da infraestrutura. A concorrência vai se dar na esfera da prestação de serviços.

O mercado financeiro calcula que os bancos, processadoras de cartões e bandeiras deixarão de ganhar com a entrada do Pix algo próximo dos R$ 100 bilhões nos próximos cinco anos com tarifas de transferência. No entanto, não reclamaram. Como diz um executivo de banco: “Eu não vivo de receita de TED”.

Talvez o motivo do silêncio é o processo de digitalização, que já está em andamento e o Pix vem acelerar, com a consequente redução de custos de toda a estrutura física e número de funcionários. O setor bancário brasileiro eliminou 9.463 postos de trabalho em 2019, conforme dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). Bradesco, Itaú e Banco do Brasil devem fechar cerca de 1,200 agências até o final de 2020.

De acordo com uma pesquisa da Febraban, as transações financeiras feitas por celular no Brasil cresceram 41% em 2019, passando de 3,2 bilhões para 4,5 bilhões de operações em plataformas digitais. Com o dinheiro migrando para o universo online, analistas acreditam que o fim do papel-moeda como conhecemos está mais próximo. No Brasil, essa ideia vai ganhar força por meio do sistema de pagamentos eletrônicos Pix.

Controle de ponta a ponta

A autoridade monetária também conta com a vantagem de que essa modalidade dá maior visibilidade às transações – especialmente àquelas que antes eram feitas com dinheiro em espécie -, com rastreamento de ponta a ponta. Oficialmente o BC diz que o Pix não tem por objetivo aumentar a capacidade de monitorar transações financeiras.

O país onde 40% dos trabalhadores estão em situação informal, de acordo com o IBGE, as transações em papel moeda geralmente acontecem sem registro, muitas vezes sem a emissão de nota fiscal. A transformação proporciona justamente o acesso aos ‘desbancarizados’.

Mais de 45 milhões de pessoas vivem sem acesso a instituições financeiras no Brasil. Ao simplificar e baratear a transferência de dinheiro entre pessoas físicas e jurídicas, o novo arranjo de pagamentos deverá acelerar a inclusão de, pelo menos, a metade desses brasileiros.

Substitui o boleto

Uma das principais mudanças potenciais para os consumidores é que o Pix pode substituir o boleto, cartão de débito e dinheiro vivo. Antes do lançamento oficial do Pix, bancos e fintechs já está disputando clientes através da conta digital desde cinco de outubro.

O Nubank liderava esta semana com 8,1 milhões de cadastros, seguido pelo Mercado Aberto, 4,7 milhões de chaves. Depois vem o PagSeguro, com 4,3 milhões e somente no quarto lugar vem um grande banco, o Bradesco, com 3,7 milhões.

Segundo o jornal Valor Econômico, a competição está cada vez mais acirrada entre as carteiras digitais. Varejistas, marketplaces, operadoras de telefonia, grandes bancos e fintechs têm ampliado a oferta de produtos e serviços financeiros por aplicativo de celular. Ao todo, o Brasil tem cerca de 600 ‘wallets’ (carteira digital que guarda as informações bancárias, dinheiro depositado, transações financeiras e senhas do usuário)

O Bradesco vai investir R$ 100 milhões no primeiro ano de operação do Bitz, sua nova empresa de carteira digital e contas de pagamento. A plataforma é um dos três pilares da estratégia digital do grupo, que conta ainda com o Next e o banco tradicional.

Com tanta concorrência, já começou a aparecer reclamações nas redes sociais de clientes que foram incluídos em cadastros sem autorização. Os bancos e fintechs negam e o Banco Central informou que está monitorando.

As chaves

Para usar o Pix, basta que o cliente peça o cadastramento no banco ou instituição financeira onde possui conta corrente, conta poupança ou carteira digital. A instituição vai fazer no Banco Central o cadastramento da “chave” escolhida pelo cliente.

Os quatro tipos de chaves Pix que poderão ser usadas e cadastradas são: número de CPF, número do CNPJ, endereço de e-mail e número do telefone celular. Esses dados ficarão registrados em uma plataforma operada pelo Banco Central, o Diretório Identificador de Contas Transacionais (CICT).

Já para usar o Pix, ou seja, para fazer transferências ou pagamentos usando o sistema, será necessário acessar o aplicativo, site ou o caixa eletrônico do banco, assim como é feito atualmente com o DOC e o TED, por exemplo. Ao invés de digitar uma série de informações, como nome completo, dados bancários e CPF, com o Pix basta inserir a chave da pessoa ou empresa que vai receber o pagamento ou transferência.

Em novembro, quando o Pix entrar no ar, vai aparecer como uma opção de pagamento dentro do aplicativo do seu banco ou carteira digital. Esses aplicativos vão ser atualizados para acomodar o Pix.

Com centenas de matérias por toda a mídia, o Pix está sendo bem vendido à população. Mesmo assim, uma sondagem feita no fim de setembro pela Globo aponta que apenas 37% das pessoas têm alguma ideia sobre o novo meio de pagamentos instantâneos, e 13% entendem o que é.

Mercado bilionário da cannabis atrai ruralistas

A previsão do mercado da indústria legal de cannabis é que esse segmento movimente US$ 166 bilhões por ano até 2025, principalmente com a legalização do consumo em diversos países, seja para uso medicinal, cosmético ou recreativo. Segundo a Euromonitor – empresa com sede em Londres que produz relatórios de inteligência de mercado -, em 2019, essa indústria movimentou US$ 12 bilhões em todo o mundo.

A América do Norte está na vanguarda em relação a cannabis. A maconha recreativa agora é legal no Canadá e em 10 estados dos EUA. A maconha medicinal é legal em 33 estados dos EUA, um forte precursor da legalização recreativa. A Euromonitor acredita na legalização federal da cannabis recreativa nos EUA nos próximos cinco anos. No resto do mundo, a maconha medicinal é uma forte perspectiva em grandes mercados como Alemanha, República Tcheca e Austrália, avançando com estruturas liberalizadas.

Neste ano, o Uruguai deve exportar 120 toneladas de cannabis medicinal e cânhamo, o que deve render cerca de US$ 60 milhões, segundo a Câmara de Empresas de Cannabis Medicinal do Uruguai. Desde 2017 a cannabis é legalizada no Uruguai, mas somente os moradores do país são autorizados a plantar em casa e comprar a erva em farmácias ou por meio dos clubes de cultivo, de acordo com a lei aprovada em 2013.

Produtos feitos com cannabis para ajudar no tratamento de epilepsia, Alzheimer, Parkinson, depressão, insônia, para atenuar dores crônicas e para ajudar contra os efeitos colaterais de quimioterapia movimentam investidores, pesquisadores, empresas e governos no mundo. Um negócio crescente com promessas bilionárias.

No Brasil, a diretoria da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou uma proposta para simplificar o procedimento para importação de produto à base de canabidiol para uso pessoal. Também liberou a venda em farmácias para uso medicinal. A regulamentação tem validade de três anos.

O problema é que a diretoria colegiada do órgão rejeitou o cultivo de maconha para fins medicinais. Por 3 votos a 1, proposta foi arquivada pela agência reguladora. Com a decisão, fabricantes que desejarem entrar no mercado precisarão importar o extrato da planta.

Projeto permite o plantio

O agronegócio brasileiro está apoiando um projeto de lei que prevê a permissão de plantios de maconha no Brasil para a produção de medicamentos. De autoria do deputado federal Fábio Mitidieri (PSD-SE), o PL 399/2015 tramita na Câmara e conta com o apoio de parlamentares do PT, PTB, PSDB, Cidadania, PSB, PSD, Psol, PCdoB e Novo, segundo o presidente da comissão especial que trata do texto, Paulo Teixeira (PT-SP).

O presidente da Frente Parlamentar do Agronegócio, Alceu Moreira (MDB-RS) disse ao jornal Valor Econômico que não tem dúvida no interesse dos produtores rurais em produzir tanto cânhamo quanto cannabis para medicamentos. E ponderou: “A Frente Parlamentar não aprovará nenhuma legislação que não dê absoluta segurança de que a produção seja especificamente para produtos medicinais.” A declaração de Moreira gerou uma grande confusão na Frente Parlamentar. Em reunião da diretoria ficou decidido que a Frente não iria mais se posicionar sobre o projeto.

A Associação de Apoio à Pesquisa e a Pacientes de Cannabis Medicinal (Apepi) lançou uma campanha na internet de apoio ao PL 399/2015. A Apepi alega que o acesso é restrito e dispendioso no Brasil e aponta que o projeto é importante por trazer a possibilidade de cultivo e produção de remédio à base de cannabis.

Está em tramitação na Comissão de Direitos Humanos do Senado, com mais de 25 mil apoios, a Sugestão nº 22 de 2018, que propõe a liberação para o cultivo caseiro de cannabis como forma de combate ao tráfico. Permite o cultivo para fins próprios de até 10 plantas adultas de maconha, sendo vetada qualquer forma de comercialização da planta, evitando que o usuário precise recorrer ao tráfico.

Desvalorização do Salário Mínimo inibe o consumo

Tancredi Falconeri diz ao tio, Don Fabrizio Corbera, príncipe de Salina: “Se não estivermos lá, eles fazem uma República. Se queremos que tudo fique como está, é preciso que tudo mude. Fui claro?”

Trecho famoso do romance Il Gattopardo (O Leopardo), sobre a decadência da aristocracia siciliana, de Giuseppe Tomasi di Lampedusa (1896/1957). O ano é 1860, período crucial do Risorgimento, no reinado de Francisco II, nas Duas Sicílias.

Para entender os movimentos do Poder no Brasil é preciso lembrar da frase de Tancredi Falconeri. A narrativa dos políticos conservadores e imprensa corporativa e de exaltação das “reformas” para recuperar a economia, os salários, os negócios, os empregos. É preciso que tudo mude.

Em 1º de fevereiro de 1954, o presidente Getúlio Vargas fez um discurso comemorativo do terceiro aniversário do governo. Ele disse: “Não é mais possível manter uma sociedade dividida entre um pequeno grupo do capital, que tudo tem, e a massa imensa do trabalho, a que tudo falta. Não é mais possível admitir a penúria no meio da opulência, a escassez no meio da abundância.”

Um mês antes, o então ministro do Trabalho, João Goulart, Jango, propôs um projeto de aumento do salário mínimo de 100%. Segundo ele, devido à elevação do custo de vida, a questão salarial continuava explosiva e, para enfrentá-la, era necessário elevar o salário mínimo de 1.200 para 2.400 cruzeiros.

Não é difícil imaginar a reação do meio empresarial provocada por esse projeto. Em fevereiro, em meio a uma grave crise política, Jango era substituído por um fiel companheiro, Hugo de Faria, que assume como ministro interino. A despeito disso tudo, no dia 1˚ de maio de 1954, Vargas anunciou o novo salário mínimo. Em agosto, Vargas se suicida.

A Política de Valorização do Salário Mínimo volta nos governos de Lula e Dilma, do Partido dos Trabalhadores (PT). É adotada em 2004 e estabelecida por lei desde 2007. O Salário Mínimo saltou de R$ 200, em 2003, para R$ 880, em 2015. Em 31 de agosto de 2016, Dilma Rousseff perde o cargo de Presidente da República após três meses de tramitação do processo de Impeachment iniciado no Senado.

Michel Temer (MDB), vice de Dilma, assume a Presidência e acaba com a Política de Valorização do Salário Mínimo. A partir de 1º de janeiro de 2017, o valor do Salário Mínimo passa para R$ 937,00, representando 6,48% sobre os R$ 880,00 em vigor durante 2016. É adotada a variação anual estimada do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC).

A proposta do governo Bolsonaro é de aumentar o Salário Mínimo em R$ 22, em 2021. Pelo segundo ano consecutivo, o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) apenas repõe a inflação projetada para 2020, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), de 2,09%.

O senador Paulo Paim (PT-RS) afirmou, em discurso no Plenário, que está preocupado com as consequências geradas pelo fim da Política de Valorização do Salário Mínimo, que previa um reajuste anual com índice equivalente à inflação mais o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB).

Segundo o senador, o Salário Mínimo beneficia indiretamente 100 milhões de brasileiros, o que representa quase metade da população do país. O senador acrescentou que o Salário Mínimo valorizado é um importante distribuidor de renda, que precisa ser corrigido anualmente para garantir melhores condições de vida, principalmente à população mais vulnerável. “Se você arrocha o salário daqueles que são compradores em potencial, independentemente do salário de cada um aqui, quem vai comprar?”, questionou.

 

Desmonte da Petrobras continua com liberação da venda de refinarias

O Supremo Tribunal Federal (STF) liberou nesta semana, por 6 votos a 4, a venda de refinarias da Petrobras à iniciativa privada sem necessidade de autorização do Congresso ou licitação. Por maioria, o plenário entendeu que não há ilegalidade na criação proposital de subsidiárias para posterior alienação de seus ativos. Como o julgamento se deu em caráter liminar, o STF deve rediscutir novamente o tema na ocasião da análise de mérito do processo, o que ainda não tem data para ocorrer.

Para o coordenador geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Deyvid Bacelar, a decisão, apesar de ser em caráter liminar, permite que o governo esquarteje não só a Petrobrás como outras estatais, criando subsidiárias para vender o patrimônio público, à revelia do Poder Legislativo.

As Mesas do Senado Federal e da Câmara dos Deputados encaminharam um pedido ao STF para que a Corte interviesse na criação e venda de subsidiárias de empresas estatais. A prática é questionada como uma “estratégia” do governo federal para privatizar partes dessas empresas sem a participação do Congresso Nacional.

O pedido partiu de um questionamento feito pelo senador Jean Paul Prates (PT-RN), presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Petrobras, ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre. Para o senador, esses procedimentos não são apenas decisões de gestão que a diretoria da estatal possa tomar sozinha.

“A missão da Petrobras sempre foi abastecer o país de derivados de petróleo. Quando muda a missão da empresa, se ela é estatal, precisa haver a participação dos representantes do povo. É um aspecto de decisão nacional”, disse Jean Paul.

O Senado e a Câmara pedem para ser incluídos como partes interessadas na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.624, que questiona vários pontos da Lei de Responsabilidade das Estatais (Lei 13.303, de 2016). Em 2019, o STF decidiu cautelarmente, no âmbito do julgamento da ação, que a venda de subsidiárias de empresas estatais não depende de autorização do Congresso. No entanto, a criação de subsidiárias precisa ser chancelada pelo Congresso.

Acordo Cade-Petrobras

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e Petrobras celebram acordo em julho de 2019 para venda de ativos no mercado de gás natural. Em despacho, o presidente do Cade, Alexandre Barreto, ponderou que o Termo de Compromisso endereça os principais problemas estruturais do mercado de gás natural. “O presente acordo amplia o acesso a mais uma importante fonte de insumos relativos ao mercado de gás natural de modo a torná-lo mais atrativo – e menos concentrado –, e de maneira a permitir a entrada, nesse setor crucial da economia brasileira, de novas empresas e de novos investimentos nacionais e internacionais nos parâmetros da regulação vigente.”

O engenheiro Paulo Cesar Ribeiro Lima, ex-consultor da Câmara dos Deputados, durante audiência na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) disse que Petrobras e o Cade violam a lei brasileira quando, no âmbito de um acordo, determinam a privatização de oito refinarias.

Segundo ele, esse acordo jamais poderia ter sido celebrado. “O acordo prevê que a Petrobras vai criar uma subsidiária para vender as oito refinarias, assim como seus dutos e terminais. É baseado numa decisão recente do STF que permite a venda de subsidiárias. Mas o processo caracteriza-se como uma fraude à Lei das Licitações [Lei 8.666, de 1993], à Lei do Petróleo [Lei 9.478, de 1997] e até à Constituição, que determina que a criação de uma subsidiária está ligada ao exercício de atividades de relevante interesse coletivo. Criar subsidiárias para vender patrimônio é uma fraude ao processo licitatório e ao Congresso Nacional, a quem cabe esse tipo de decisão”, afirmou.

O engenheiro ainda criticou fortemente o Preço de Paridade Internacional (PPI), critério que passou a ser usado pela Petrobras na definição da maior parte dos preços de combustíveis vendidos pela empresa ao consumidor brasileiro. O ex-consultor adverte que, sob o manto do PPI, o que a Petrobras pratica de fato é o preço de paridade de importação, e quem paga a conta é o povo. Outro problema causado pelo PPI é a ociosidade na capacidade local de refino, conforme ele.

“O povo brasileiro paga o preço de paridade de importação do óleo diesel, no QAV [querosene para aviação], no óleo combustível e no GLP [gás de cozinha]. Outra consequência do PPI é que nós poderíamos estar refinando 2,4 milhões de barris por dia, mas estamos refinando só 1,7 milhão (2019). Os critérios da Petrobras estimulam a importação, e nós ainda ficamos com capacidade ociosa. Quase 30% da capacidade das refinarias já está ociosa”, lamentou.

Ribeiro Lima também alerta que a privatização das refinarias deve aumentar o custo de produção dos derivados em quase 70%. Isso porque, além de a Petrobras produzir a um custo menor, as compradoras buscarão compensar o investimento realizado.

Importação de derivados

Um estudo do BNDES informa que a demanda brasileira por derivados de petróleo, em 2017, foi de aproximadamente 2,23 milhões de barris/dia. No entanto, nesse ano, o Brasil produziu apenas cerca de 1,82 milhão de barris/dia de derivados, o que resultou em importação líquida de cerca de 400 mil barris/dia de gasolina, diesel, querosene de aviação (QAV), nafta e gás liquefeito de petróleo (GLP).

A Petrobras executou um vigoroso programa de modernização, ampliação e aumento da eficiência de suas refinarias entre 2002 e 2013. Nesse período, ela investiu R$ 174,8 bilhões em sua área de abastecimento, atingindo, em 2014, um volume recorde de produção de 2,17 milhões de barris/dia de derivados.

A partir de 2015, contudo, o volume produzido foi diminuindo até chegar a 1,8 milhão de barris/dia em 2017, o que, segundo a Petrobras, ocorreu “principalmente em função do aumento da importação por terceiros”. Em 2017, o país importou US$ 9,4 bilhões em derivados de petróleo.

De acordo com as projeções contidas no Plano Decenal de Energia (PDE) – 2026, o Brasil deverá exportar em torno de 2,6 milhões de barris/dia de petróleo cru em 2026. Contudo, caso não sejam realizados novos investimentos na expansão da capacidade de refino do país até lá, isso levaria a um déficit estimado em mais de 370 mil barris/dia de derivados de petróleo, resultando em um impacto de cerca de US$ 9,2 bilhões na balança comercial do país em 2026.

Renda Cidadã bate de frente com a dívida pública

Após a divulgação do Renda Cidadã, novo programa de transferência de renda do governo federal, que substituirá o auxílio emergencial e o Bolsa Família, houve uma reação imediata do mercado.

O principal motivo é a indefinição sobre a manutenção do teto de gastos, Emenda Constitucional 95, de 2017. Ela congela os gastos públicos de saúde e educação por 20 anos. Seu objetivo é controlar a dívida pública federal, que financia o déficit da União.

A dívida pública, em agosto, bateu nos R$ 4,412 trilhões. Para se ter uma ideia desse valor, o total do Orçamento de 2020 encaminhado pelo governo federal ao Congresso foi de R$ 3,8 trilhões. Destes, R$ 1,9 trilhão refere-se a amortizações, juros, refinanciamentos e encargos financeiros da dívida pública. Isso correspondeu a 50,7 % do total do Orçamento, maior volume já gasto na história do país em manutenção anual da dívida pública.

O dinheiro para a Renda Cidadã poderá vir dos precatórios, como se informa, ou de qualquer outra fonte, representará mais dívida.

Também em agosto houve a autorização, por parte do Conselho Monetário Nacional (CMN), de transferência de R$ 325 bilhões de reservas de resultado cambial do Banco Central para pagamento da Dívida Pública Mobiliária Interna. A dívida pública está praticamente nas mãos de investidores nacionais. Em julho, os não residentes no país detinham 9,04% da dívida total, o equivalente a R$ 372,41 bilhões.

Operações compromissadas

Para tentar melhorar a imagem do Brasil, o senador Esperidião Amin (PP-SC) sugeriu avançar no debate sobre a possibilidade de diminuir o impacto das operações do Banco Central na dívida pública brasileira. Atualmente, para enxugar liquidez, o BC faz as chamadas operações compromissadas — que envolvem títulos do Tesouro indexados à taxa básica de juros (Selic) em transações com instituições financeiras com prazos curtíssimos — que hoje respondem por quase 25% da dívida pública.

As operações compromissadas, em outras palavras, significam remuneração da sobra de caixa dos bancos. O gasto com tais operações, que correspondem à remuneração de um depósito voluntário feito por bancos junto ao BC, custou cerca de R$ 1 trilhão de reais em 10 anos (2009 a 2018), conforme números do Banco Central.

O problema dessa operação é que ela é incluída no cômputo da dívida pública. Quanto mais dessas operações o BC realiza, mais a dívida pública é afetada.