Ney Gastal, jornalista e ambientalista (anotações para um perfil)

Foi sepultado no São Miguel e Almas em Porto Alegre o jornalista Ney Gastal. Ele morreu na madrugada desta segunda-feira, aos 72 anos.

Filho de Paulo Fontoura Gastal, criador e editor do “Caderno de Sábado”, lendário suplemento cultural do Correio do Povo, dos anos 60, Ney cresceu correndo entre as vetustas mesas da redação, onde sentavam Mário Quintana, Oswaldo Goidanich, Carlos Reverbel, Carlos Guimarães.

No “Correião”, ele começou como profissional. Foi repórter,  redator, editor e pensava em passar a vida toda ali. Mas o jornal faliu em 1984. Escreveu críticas sobre cinema e música para a Folha da Tarde e, de repente, se deu conta que estava cansado das limitações imposta nas grandes redações: “Você descobre que toda a imprensa é manipulada e que, na maioria das vezes, o que censura, o que bloqueia, o que impede é o medo. O medo de perder o salário no fim do mês, de perder o emprego”, disse num depoimento em 2012.
Em 1985, estava no grupo de jornalistas e intelectuais que fundaram o jornal JÁ. Foi editor das quatro primeiras edições do novo veículo que, então, se apresentava como “um jornal de opinião e cultura”.

Em seguida, deixou o jornalismo para se dedicar à causa ambiental. Foi assessor de José Lutzenberger na Secretaria Especial de Meio Ambiente do Governo Federal (Semam) e da presidência da Fundação Estadual de Meio Ambiente (Fepam). Também foi diretor do Museu de Ciências Naturais da Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul (de 2003 a 2006) e presidente da Associação Brasileira para a Preservação Ambiental (Abrapa).

Era casado com a também jornalista Ânia Chala.

 

 

 

Pesquisa: a precarização do trabalho em regimes autoritários

Foi o momento mais difícil da minha vida”, diz a cientista brasileira Rosana Pinheiro Machado, de 43 anos, a respeito da cena cinematográfica (de suspense ou drama, você decide) que protagonizou nesta quinta-feira (17).
Locação: um ponto de ônibus da Universidade de Bath, na Inglaterra, onde ela dá aulas.
Situação meteorológica: chuva, muita chuva.
Objetivo: consultar o resultado de um processo seletivo que havia lhe custado 18 meses de dedicação e que renderia um financiamento de 2 milhões de euros (R$ 11 milhões) para sua pesquisa na área de ciências sociais.
Conflito: com os dedos molhados e a roupa encharcada, era impossível desbloquear a tela do celular para fazer a consulta. E aí?

Foram 10 minutos tentando.
Quando finalmente conseguiu ler a carta-resultado, Machado estava tão nervosa, que apelou para uma leitura dinâmica em busca de palavras como “aprovada” ou “aceita”.
E encontrou o que queria: “I’m pleased to” (traduzindo: “é com prazer que…”). Era a confirmação da verba milionária que bancará seu estudo sobre a relação entre precarização do trabalho e governos autoritários no Brasil, na Índia e nas Filipinas.
Os R$ 11 milhões serão concedidos por um órgão da União Europeia (Conselho Europeu de Investigação – ERC, na sigla em inglês), após rigorosa análise de currículos e sabatinas com nomes importantes da academia.
A seguinte informação comprova a relevância desse financiamento: de 2007 a 2021,  nove pesquisadores apoiados pelo ERC ganharam o prêmio Nobel.
Considerando todos os segmentos (ciências sociais, ciências da natureza e física/engenharia), submeteram-se a esta edição do processo seletivo: 2.652 projetos, principalmente da Alemanha, do Reino Unido e da França. Só 12% (313) foram aprovados e agora dividirão a verba total de 632 milhões de euros.

“Em alguns momentos, passei de 12 a 15 horas do meu dia me preparando para essas entrevistas. Eu precisava convencer [a banca] de que uma antropóloga é capaz de liderar uma pesquisa sobre ciência de dados”, conta a professora.

Nascida em Porto Alegre, Machado sempre estudou na rede pública. Aprendeu inglês, segundo ela, “tardiamente, só aos 26 anos”, o que a faz até hoje suar frio em apresentações no idioma (mesmo depois de já ter lecionado nas universidades de Harvard (nos EUA), como visitante, e de Oxford (na Inglaterra).
“A insegurança nunca acaba. Mas nem essa dificuldade me impediu de ser aprovada.”
Sobre o que é a pesquisa?

O estudo da brasileira busca analisar como governos populistas e autoritários conseguem recrutar apoiadores por meio de mensagens sobre empreendedorismo e individualismo.
Segundo Machado, o foco serão os trabalhadores “plataformizados” e informais da economia digital, como motoristas de aplicativo e vendedores de produtos por redes sociais.
“São grupos que passam 15 horas por dia empreendendo on-line e que estão mais expostos a uma esfera na qual a extrema direita tem mais hegemonia: a digital”, diz a pesquisadora.

“Vamos analisar por que essas novas camadas médias da população são (ou não) alinhadas a esses políticos [conservadores].”
Não é a primeira experiência da brasileira neste assunto da precarização do mercado: desde a iniciação científica na graduação (ciências sociais) até o mestrado e o doutorado (antropologia), ela explora temas como camelôs de Porto Alegre, consumo popular em favelas do país e venda de “muambas” na China (onde, inclusive, chegou a morar durante a pesquisa).
Como usar os R$ 11 milhões do financiamento?

Machado conta que os R$ 11 milhões serão distribuídos da seguinte forma:
75% para a contratação de pesquisadores (doutorandos ou pós-doutorandos, que farão estudos etnográficos por 4 anos no Brasil, na Índia e nas Filipinas);
25% para cobrir custos do trabalho de campo e da divulgação científica (em sites, vídeos e publicações abertas para o público).

A ideia é que, ao longo dos próximos 5 anos, a pesquisa renda publicações de várias teses e artigos científicos.
“Estou até agora me recuperando da notícia [da aprovação do financiamento]”, diz Machado. “Minha conquista mostra que pesquisadores de ciências humanas também podem liderar estudos internacionais. É possível e importante que isso aconteça.”

Um dia de luta para a imprensa e a cultura

Por Márcia Turcato, de Brasília

A segurança dos jornalistas e a liberdade de imprensa durante o processo eleitoral de 2022 será tema de audiência pública na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara dos Deputados. A proposta da deputada Luíza Erundina (PSOL/SP) e do deputado Gustavo Fruet (PDT/PR) foi aprovada nesta terça-feira (01/06).

Para justificar o pedido de audiência, os  autores do requerimento apresentaram dados de agressão a jornalistas e a veículos de imprensa da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), da Associação Nacional de Jornalistas Investigativos (Abraji) e da associação internacional Repórteres sem Fronteiras.

De acordo com a deputada Luiza Erundina, as eleições de 2022 no Brasil serão realizadas em um contexto de crescentes ataques a jornalistas, comunicadores e violações da liberdade de imprensa, que tendem a se agravar durante a campanha. Ela citou o levantamento feito pela Fenaj, entre 2019 e 2021, apontando que a violência contra jornalistas no Brasil somou 1.066 ocorrências – total superior à soma de todos os episódios já registrados pela entidade.

A Abraji, que realizou pesquisa semelhante em 2021, registrou 453 ataques contra comunicadores e meios de comunicação. Em 69% dos casos, a agressão foi provocada por agentes públicos, como ministros e o próprio presidente da República. Já o levantamento da associação Repórteres Sem Fronteiras, em parceria com o Instituto Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro, registrou, somente entre março e junho de 2021, meio milhão de tweets contendo hashtags com ataques à imprensa nesta rede social.

Serão convidados para participar da audiência pública, que deve ocorrer ainda em junho, representantes da Fenaj, da Abraji, do Repórteres sem Fronteira, do Tribunal Superior Eleitoral, do Ministério Público Federal, da Secretaria Nacional de Direitos Humanos e do Twitter Brasil.

Comissão de Cultura

Logo após a reunião da CCTCI, foi a vez do setor cultural ter voz na Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados.

Em audiência pública conduzida pela deputada Jandira Feghali (PCdoB/RJ), artistas, cineastas, diretores, poetas e produtores discutiram a derrubada dos vetos do presidente da República às leis Aldir Blanc 2 e Paulo Gustavo.

A apreciação dos vetos pela Câmara e Senado deve ocorrer na próxima semana. Segundo a deputada Jandira Feghali, os dois vetos devem ser derrubados porque o entendimento da maioria é que o setor cultural necessita de auxílio financeiro e que existe recurso para isto.

A lei Aldir Balnc 2 amplia o número de  beneficiados pelo auxílio federal frente aos prejuízos impostos pela pandemia de covid-19, fixando um repasse de três bilhões de Reais para o setor cultural em todas as Unidades da Federação durante cinco anos. A segunda lei destina 3,86 bilhões de Reais a estados e municípios, sendo que 1,06 bilhão de Reais são para ações emergenciais.

A produtora cultural Rita Andrade, de Brasília, e que integra o Conselho Nacional de Cultura, participou da reunião e destacou que a cultura é o mais democrático dos setores produtivos porque todos têm acesso a acesso a ela, sendo quando assistem um filme na TV ou cinema, quando compram um livro ou vão a um show, por exemplo.

Participaram da audiência pública, entre outros, Fabrício Noronha, presidente do Fórum Nacional de Secretários e Dirigentes Estaduais de Cultura; Ana Castro, presidente do Fórum Nacional de Gestores de Cultura; Eduardo Barata, da Associação de Produtores de Teatro; Bianca de Felippes, da Gávea Filmes; Fred Maia, da Mídia Ninja; Célio Turino, criador dos Pontos de Cultura; e as atrizes Julia Lemmertz e Rose Campos.

 

Itamaraty censura filme sobre Chico Buarque no Uruguai

A JBM Producciones do Uruguai comunicou ao diretor Miguel Faria Junior que seu filme “Chico: Artista Brasileiro”, 2015, sobre o grande músico brasileiro, foi censurado pela Embaixada brasileira em Montevideo.
A Embaixada, uma das patrocinadoras do Festival Cine de Brasil 2019, a ser realizada em outubro, avisou aos produtores do evento que o filme, que narra a trajetória musical de Chico nos últimos 50 anos, estava proibido de integrar a mostra. Leia abaixo a carta enviada pela produtora ao diretor Miguel Faria: ”
“Querido Miguel
Quiero informar cómo van las cosas camino al estreno, finalmente, de CHICO en Uruguay. Junto a nuestra asociada ENEC quien además de distribuidores son exhibidores, habíamos planificado estrenar el filme en el Festival de Cine de Brasil 2019 que se lleva a cabo en octubre y entre otros es auspiciado por la Embajada de Brasil en Montevideo. Esta mañana recibo un sorpresivo mensaje del exhibidor diciéndome que los llamaron de la embajada para “pedirles” que NO se exhiba el filme de CHICO en ese festival. Si bien es lógico debido a la situación política de Brasil, en Uruguay es muy grave que se censure la exhibición de una película siendo que en este caso JMB Filmes de Uruguay es el distribuidor y este acto afecta nuestros intereses. Adjunto mas abajo copia del mensaje oficial de ENEC (dueños socios de la sala ALFA/BETA) comunicándomelo y un archivo adjunto de audio de la llamada de una señora, suponemos desde Brasil, que avisa a la sala de la desición de la embajda de Brasil en Uruguay.”
(Com informações do O Globo)

Governo suspende edital com séries de temática LGBT criticadas por Bolsonaro

Alvo de críticas do presidente Jair Bolsonaro em sua última live semanal, veiculada na quinta passada (15), um edital de chamamento de projetos para TVs públicas que tinha entre as categorias de investimento séries LGBT foi suspenso. Uma portaria assinada pelo Ministro da Cidadania Osmar Terra publicada no Diário Oficial da União (DOU) nesta quarta (21) oficializou a decisão.
Na live, o presidente havia criticado quatro projetos de séries aprovados para a última fase do concurso e inscritos nas seções de diversidade de gênero e sexualidade. Eram eles “Afronte”, “Transversais”, “Religare Queer” e “Sexo Reverso”.
Caso aprovados por uma comissão especial, os projetos seriam contemplados com verbas de R$ 400 mil a R$ 800 mil cada um, oriundas do Fundo Setorial do Audiovisual (FSA).
O caso acontece depois de uma série de declarações em que Bolsonaro promete intervir no teor das produções financiadas por meio da Agência Nacional do Audiovisual, a Ancine, seja criando um “filtro” cultural ou tirando o FSA do controle da agência, entre outros. Na live, ele chegou a afirmar que se o órgão “não tivesse, em sua cabeça toda, mandatos”, ele já teria “degolado tudo”.
Com a suspensão do concurso por no mínimo seis meses, no entanto, os projetos citados pelo presidente na live não serão os únicos prejudicados. Isso porque o edital ainda previa o financiamento de cerca de outras 70 iniciativas divididas em 12 categorias, como sociedade e meio ambiente, qualidade de vida e profissões.
Com verbas de até R$ 1,5 milhão, cada uma das seções teria cinco vencedores, um para cada região do país.
O diretor de “Transversais”, série documental que pretende se debruçar sobre os sonhos e desafios de cinco pessoas transgênero que moram no Ceará, Émerson Maranhão especula que a suspensão temporária tenha sido a maneira que o Ministério da Cidadania encontrou de não pagar os recursos aos vencedores, já que não poderia modificar o edital.
“Éramos quatro realizadores, agora seremos 80”, diz o cineasta.
Ele e o produtor executivo de “Transversais” afirmam ter encaminhado ofícios questionando os pronunciamentos de Bolsonaro ao Ministério da Cidadania e à Agência Nacional de Cinema, a Ancine, que gere o Fundo Setorial de Audiovisual, no dia seguinte à live. Agora, pretendem tomar ações jurídicas em relação à suspensão do edital.
Na portaria publicada no Diário Oficial, o Ministério da Cidadania dá como justificativa para o cancelamento temporário do concurso a necessidade de recomposição dos membros do Comitê Gestor do Fundo Setorial, informação antecipada pela Folha em reportagem publicada na terça (20).
Uma vez recomposto, ainda de acordo com a portaria, o comitê revisará os critérios e diretrizes para a aplicação dos recursos do fundo, assim como os parâmetros de julgamento dos projetos e seus limites de valor. (Com informações da Folha de São Paulo)