Mais uma importante etapa das obras de implantação do Parque Eólico Coxilha Negra foi registrada pela Eletrobras CGT Eletrosul, no município de Sant’Ana do Livramento (RS).
Foi concluída a montagem mecânica dos quatro primeiros aerogeradores do empreendimento, que contará com 72 unidades. O procedimento envolveu a instalação de nacele, gerador e cubo com as pás nas quatro torres iniciais. Esta etapa consiste no içamento da nacele com seus acessórios, seguido pelo gerador e, por fim, o cubo em configuração estrela com as três pás.
Cada aerogerador pesa 1.320 toneladas, mede 125 metros de altura e cada pá tem 72 metros de comprimento
O peso total de cada aerogerador é de 1.320 toneladas; as torres possuem 125 metros de altura e cada pá tem 72 metros de comprimento.
As obras relacionadas ao sistema de transmissão também evoluem. Na última semana de novembro, foram concluídas as linhas de transmissão que irão operar em 230 kV. As duas subestações coletoras (34,5kV / 230kV) também seguem em estágio avançado: Coxilha Negra 2 (280 MVA – dois transformadores, e um terceiro reserva) e Coxilha Negra 3 (140 MVA), além da ampliação da Subestação Livramento 3 (Sant’Ana Transmissora).
Entre o final de outubro e início de novembro, foi registrada a chegada dos primeiros componentes dos aerogeradores, em Sant’Ana do Livramento. Essa remessa inicial de equipamentos é composta por hubs, geradores e naceles – todos transportados de Jaraguá do Sul (SC), pela fabricante WEG.
Além das estruturas provenientes de Santa Catarina, no dia 14 de novembro, o conjunto com as primeiras 20 pás fabricadas no Ceará, pela empresa subcontratada Aeris, atracou no Porto de Rio Grande (RS), seguindo viagem rumo à Sant’Ana do Livramento.
Para a viabilização do Parque Eólico Coxilha Negra, foram construídos aproximadamente 100 km de novos acessos, além da revitalização de outros 56 km de estradas rurais municipais.
Durante os diversos estágios das obras, estima-se a criação de 1.300 empregos. Neste momento, as diferentes frentes de trabalho contam com a mobilização em campo de aproximadamente 1.035 profissionais contratados pelas empresas prestadoras de serviços. Cerca de 530 trabalhadores são do Rio Grande do Sul e os demais são provenientes de outros estados.
Alinhado com a Política de Responsabilidade Social da Eletrobras, o processo de contratação de mão de obra é conduzido pelas empresas prestadoras de serviços e prioriza a seleção de profissionais dos municípios da região, por meio de parcerias com centros locais de empregabilidade. Para atender demandas específicas, por tempo determinado, e que exigem qualificação especializada, as empresas prestadoras de serviços contam com quadro técnico próprio flutuante ou realizam recrutamento externo para preenchimento pontual de vagas temporárias de acordo com a evolução das obras.
O Parque Eólico Coxilha Negra terá capacidade instalada de 302,4 MW, integrando três conjuntos de usinas que totalizarão 72 aerogeradores: Coxilha Negra 2, Coxilha Negra 3 e Coxilha Negra 4. O início da operação do empreendimento ocorrerá em 2024.
O Brasil ultrapassou a marca de 11 gigawatts (GW) de potência operacional nas grandes usinas solares, de acordo com o mapeamento da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (ABSOLAR).
Segundo a entidade, desde 2012, o segmento já trouxe mais de R$ 49,1 bilhões em novos investimentos e mais de 330,1 mil empregos acumulados, além de proporcionar cerca de R$ 17,2 bilhões em arrecadação aos cofres públicos.
Atualmente, as usinas solares de grande porte operam em todos os estados brasileiros, com liderança, em termos de potência instalada, da região Nordeste, com 55,57% de representatividade, seguida pelo Sudeste, com 42,99%, Sul, com 0,54%, Norte, com 0,51% e Centro-Oeste (mais DF), com 0,39%.
“O crescimento da energia solar fortalece a sustentabilidade, alivia o orçamento das famílias e amplia a competitividade dos setores produtivos brasileiros, fatores cada vez mais importantes para a economia nacional e para o cumprimento dos compromissos ambientais assumidos pelo País”, diz Rodrigo Sauaia, da Absolar.
Ronaldo Koloszuk, presidente do Conselho de Administração da entidade, avalia que “o crescimento acelerado da energia solar é tendência mundial e colabora para o processo de descarbonização das economias. “O Brasil possui um dos melhores recursos solares do planeta, o que abre uma enorme possibilidade para a produção do hidrogênio verde (H2V) mais barato do mundo e o desenvolvimento de novas tecnologias sinérgicas, como o armazenamento de energia e os veículos elétricos”, diz.
“Segundo estudo da consultoria Mckinsey, o Brasil poderá ter uma nova matriz elétrica inteira até 2040 destinada à produção do H2V. Para tanto, o País deverá receber cerca de R$ 1 trilhão em investimentos no período, como geração de eletricidade, linhas de transmissão, unidades fabris do combustível e estruturas associadas, incluindo terminais portuários, dutos e armazenagem”, acrescenta Koloszuk.
Agricultores que participam das feiras ecológicas de Porto Alegre e consumidores irão realizar uma manifestação neste sábado (28) pela manhã, no Parque Farroupilha, em reação às propostas da Prefeitura Municipal para regulamentar as feiras de rua.
O Executivo enviou um projeto de Lei com essa finalidade à Câmara Municipal dia 19 deste mês.
Mas as discussões iniciaram há pelo menos quatro anos. Categorizar e criar regras específicas para os produtores feirantes interessa a todos porque, hoje, a mesma lei regula atividades distintas como a dos ambulantes e dos artesãos.
Entretanto, uma das representantes do Conselho de Feiras Ecológicas de Porto Alegre, Fran Bellé, afirma que há alguns artigos preocupantes, dentre eles, a prioridade aos produtores da Capital para ocupar as vagas disponíveis mediante edital; a possibilidade de comerciantes participarem das concorrências, sem deixar claro se devem ser produtores; a perda da autogestão nas unidades de feiras, passando a coordenação para o Executivo municipal e o enfraquecimento do associativismo e do cooperativismo histórico presente nas feiras.
O secretário municipal Cassio Trogildo, da Governança Local e Coordenação Política, diz que o projeto foi protocolado depois de oito meses de amplo debate e que ainda haverá uma Audiência Pública a ser realizada pelo Legislativo antes da votação do projeto.
Nestas ocasiões, todos os pontos da proposta foram discutidos detalhadamente, observando-se cada sugestão ou questionamento dos presentes que se manifestaram. A partir destas contribuições, o documento foi atualizado diversas vezes. Entre as garantias legais, o Projeto de Lei apresentado contempla a continuidade e publicação da relação dos feirantes que hoje têm o alvará vigente emitido pela prefeitura, a sucessão familiar e a autogestão das feiras.
Confira os locais, dias e horários das Feiras Ecológicas de Porto Alegre:
Feira dos Agricultores Ecologistas – FAE
Todos os sábados, das 7h às 13h.
Região Centro: Avenida José Bonifácio, 675 (quadra 1).
Feira Ecológica do Bom Fim
Todos os sábados, das 7h às 13h.
Região Centro: Avenida José Bonifácio, 675 (quadra 2).
Feira Ecológica da Tristeza
Todos os sábados, das 7h às 12h.
Região Sul: Avenida Otto Niemeyer esquina com a Avenida Wenceslau Escobar.
Feira Ecológica Três Figueiras
Todos os sábados, das 7h às 12h30.
Região Leste: Rua Cel. Armando Assis, Praça Desembargador La Hire Guerra.
Feira Ecológica Praça André Forster
Todos os sábados, das 7h às 12h30.
Região Centro: Rua Rômulo Telles Pessoa, Praça André Forster.
Feira Ecológica Park Lindóia
Todos os sábados, das 7h à 12h.
Região Noroeste: Rua Eduardo Maurel Muller (atrás do Boulevard Assis Brasil).
Feira Ecológica Auxiliadora
Todas as terças-feiras, das 7h às 12h.
Região Centro: Travessa Lanceiros Negros (passagem de pedestres entre as ruas Mata Bacelar e a Coronel Bordini).
Feira Ecológica do Centro Administrativo Municipal Guilherme Socias Villela
A Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema) vai selecionar voluntários para atuarem no Parque Estadual de Itapuã (PEI), no dia 01 de novembro, em Viamão.
São oferecidas vagas para desempenhar atividades de limpeza das praias do parque, por meio da remoção e coleta de resíduos sólidos localizados na orla. Os recentes acontecimentos climáticos, ciclones extratropicais e o grande volume de chuvas resultaram no acúmulo de resíduos e detritos nas praias do PEI.
Podem prestar o serviço voluntariado os cidadãos com idade mínima de 18 anos e maiores de 16 anos com autorização dos responsáveis, portar documento oficial válido, estar em gozo de saúde para desempenhar as atividades ao ar livre e preencher o Termo de Adesão e Plano de Trabalho antes do início das atividades.
Os candidatos deverão realizar a pré-inscrição neste link. Também serão admitidos os candidatos que se apresentarem no centro de visitantes do PEI, por ordem de chegada. Será disponibilizado transporte – com saída do prédio do Centro Administrativo Fernando Ferrari (Caff), localizado na Av. Borges de Medeiros, 1501 – aos voluntários que requisitarem, antecipadamente, por meio de formulário de pré-inscrição.
A ação terá duração total de seis horas, com início às 10h e encerramento às 16h. Para a realização das atividades, os voluntários devem portar calçados fechados, luvas de látex, boné, protetor solar e repelente. A Sema emitirá certificado de participação após o cumprimento das atividades previstas no Termo de Adesão e Plano de Trabalho.
O edital também prevê a possibilidade de pessoas física e jurídica apoiarem as ações desenvolvidas pelo Programa. O Parceiro do Voluntariado pode auxiliar de forma material, financeira, técnica ou logística. Interessados podem conferir a lista de possibilidades de apoio e realizar a inscrição neste formulário.
Mais informações:
Edital na íntegra: DOE Edital 04 2023 (.pdf 59,24 KBytes)
Lista para Parceiros: lista de apoio (.pdf 97,79 KBytes)
Sob o título “Parque da Orla ganhará mais de 107% de vegetais”, a assessoria de imprensa da GAM3 distribuiu a seguinte nota, no dia 9 de maio de 2023:
“Atualmente em execução, projeto prevê que Parque Harmonia terá mais de 2800 árvores” “Um dos pontos turísticos mais importantes de Porto Alegre ficará ainda mais arborizado. Depois do plantio de 38 mudas de ipês-amarelos no trecho 1 da orla, a equipe ambiental da GAM3 Parks divulga projeto de arborização do Parque da Orla.
Através de seu time de biólogos e engenheiros, a concessionária realizou levantamento de cobertura vegetal do Parque Harmonia, identificando 1.361 vegetais na área quando assumiu a concessão.
No projeto de revitalização do parque, está previsto o aumento de cerca de 107% de árvores nativas de Porto Alegre. Ou seja, das 1361 unidades, em breve serão 2820.
— Nossa proposta desde o início é criar um parque integrado com a natureza. Portanto, possuímos um grupo ambiental para planejar e criar ações visando a ampliação da cobertura vegetal — destaca Carla Deboni, diretora administrativa da GAM3 Parks.
Alguns vegetais terão que ser retirados, muitos deles devido ao estado fitossanitário ruim e/ou com risco de queda. Aqueles que foram removidos são estritamente necessários, sendo que a concessionária possui autorização dos órgãos ambientais, além de uma equipe de biólogos dedicados ao acompanhamento. — Durante nossos estudos não pensamos apenas em compensar aqueles vegetais que foram removidos, queremos ampliar essa cobertura e dar prioridade a árvores nativas, fortalecendo o bioma natural da região — avisa Piettro Kayser, conselheiro da GAM3 Parks e responsável pela equipe ambiental.
A previsão de conclusão total do Parque da Orla é para 2027, então, muito em breve, uma maior quantidade de área verde com características da fauna local estarão presentes no Parque Harmonia.
Esse processo beneficia não só a fauna do parque, mas também a população, que terá à sua disposição um ambiente mais florido e seguro para ser frequentado”.
O consórcio que ganhou a concessão do parque Harmonia e do trecho 1 da Orla do GuaÍba é uma “Sociedade de Propósito Específico” formada por três empresas:– Deboni Empreendimentos, construtora e incorporadora– Grupo Austral, especializada em marqueting e promoção de eventos.-3 M Produções, que desenvolve e produz stands e projetos arquitetônicos para eventos.As três formaram o consórcio GAM 3 Parks, com capital social de R$ 5 milhões, formalizado em dezembro de 2020, quando recebeu o CNPJ 40.141.808/0001-3.Já era, desde o leilão em setembro, concessionário do parque Marinha e do Trecho 1 da Orla do Guaiba. (O contrato foi assinado em março de 2021).
Apesar da importância da concessão, o consórcio não despertou a curiosidade da mídia. São escassas as informações publicadas sobre a formação do grupo, sua composição acionária, seus dirigentes.
Pelo porte do projeto, que prevê investimentos de R$ 281 milhões, evidencia-se que a Deboni Empreendimentos lidera o negócio, até pela presença de Carlos Alberto Deboni na presidência do consórcio.
Em seu site, a Deboni Empreendimentos menciona a experiência da familia Deboni em “mais de 40 anos na construção civil”, mas no seu portfólio só aparece o Edifício Sodré, uma construção modulada com seis apartamentos, na zona norte de Porto Alegre.
No site do consórcio GAM 3, diz que a Deboni Empreendimentos “faz parte do Grupo Deboni, que atua há mais de 45 anos na área de engenharia e construção no segmento público e privado no Brasil”. “Desenvolve soluções com inovação e tecnologia na administração e concessão de shoppings populares (Pop Center) em Porto Alegre e Pelotas, no Rio Grande do Sul, na construção industrializada, do projeto ao acabamento, conforme a necessidade”.
A Deboni Construções e Incorporações é pioneira no setor de construções pré-moldadas, “atualmente é a maior construtora modular e do ramo prisional do Brasil”. Já construiu mais de 100 presídios em dez estados.
A Austral e a 3 M Produções, as outras duas integrantes do consórcio que ganhou a concessão do parque Harmonia e trecho 1 da Orla, são empresas locais de pequeno porte, do setor de serviços.
O Grupo Austral se apresenta como “uma agência ‘Beyond the Line’ que presta serviços em perfeita sintonia nas áreas de marketing promocional e estratégico, eventos, patrocínios e varejo”.
A 3M Produções e Eventos diz em seu site que “liderou os estudos do PMI (procedimento de manifestação de interesse) para a revitalização do Parque da Harmonia. Foi escolhida para centralizar as ações relacionadas à concessão tendo em vista a complexidade”. Tornou-se uma das concessionárias.
No cartão do CNPJ do consórcio GAM 3 Parks consta como “atividade principal” :
Serviço de Organização de Feiras, congressos, exposições e festas.
E como “atividades econômicas secundárias:
Incorporação de empreendimentos imobiliários
Obras de urbanização – ruas, praças e calçadas
Comércio varejista de bebidas
Comércio varejista de outros produtos não especificados anteriormente
Estacionamento de veículos
Bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, sem entretenimento
Bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, com entretenimento
Gestão e administração da propriedade imobiliária
Serviços de engenharia
Atividades de intermediação e agenciamento de serviços e negócios em geral, exceto imobiliários.
O juiz Eugênio Couto Terra, da 10ª Vara da Fazenda Pública do Foro Central de Porto Alegre, julgou parcialmente procedente o pedido do Ministério Público Estadual para que obrigue o Estado a preservar o patrimônio ambiental e cultural do Jardim Botânico de Porto Alegre (JBPOA) e do Museu de Ciências Naturais do Rio Grande do Sul (MCN).
A sentença foi publicada nesta segunda-feira, 31 de julho.
A Ação Civil Pública (ACP) foi movida pela Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente de Porto Alegre em fevereiro de 2017, logo após o governo de José Ivo Sartori decretar a extinção da Fundação Zoobotânica do RS e a demissão dos servidores do JBPOA, MCN e Parque Zoológico, as três instituições vinculadas a FZB.
Hoje, elas são administrados pela Secretaria de Meio Ambiente e Infraestrutura, a SEMA.
Quatro ongs ambientais constaram como assistentes do MPE: Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), Igré Amigos da Água, Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (INGÁ) e União pela Vida (UPV).
Processo judicial/Cleber Dioni
Na decisão, o magistrado proíbe a rescisão de acordos ou contratos que impliquem as atividades de educação ambiental, preservação dos acervos ou pesquisa científica, e impede o desmembramento ou fracionamento da matrícula do imóvel do Botânico.
“A própria Lei Estadual nº 14.982/2017, em seu artigo 8º e parágrafo único, assegura e declara a preservação, proteção e vedação de destinação diversa da original ao Jardim Botânico de Porto Alegre (nele compreendido o Museu de Ciências Naturais). Neste sentido, qualquer alteração na área do Jardim Botânico se mostra inconstitucional e ilegal, sendo vedado o retrocesso ambiental, consoante normas supra elencadas que lhe garantem proteção especial”, diz a sentença.
O Estado deve garantir a continuidade e a mesma qualificação de todos os serviços e atividades do Jardim Botânico e do Museu de Ciências Naturais, e providenciar imediatamente o conserto do muro que faz a divisa com a Vila Juliano Moreira.
A sentença impede que o governo do Estado se desfaça de qualquer bem, móvel, imóvel e de animais que constituem o patrimônio material e imaterial do Jardim Botânico e do Museu de Ciências Naturais. O Parque Zoológico não está contemplado nesta ação.
O acolhimento da demanda é parcial, porque os autores da ação pediam também a suspensão da extinção da Fundação Zoobotânica, que já estava consumada.
A promotora de Justiça Vera Sapko informou que o processo de concessão anunciado pelo Estado tem que atender às determinações da Justiça previstas na ação civil pública.
“Vamos garantir que a ACP seja cumprida de forma integral a decisão, assim como as obrigações que o futuro concessionário assumirá perante o Governo do Estado”, afirmou.
Após as vistorias, o juiz realizou audiência com promotores de Justiça e representantes da SEMA no Foro Central de Porto Alegre.
No Departamento de PaleontologiaNo Bromeliário do Jardim Botânico
Em quatro dias, promotores de Justiça produziram 60 páginas
A Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente de Porto Alegre ingressou com a Ação Civil Pública com a intenção de preservar o patrimônio ambiental e cultural do Jardim Botânico e do Museu de Ciências Naturais do Rio Grande do Sul. O Parque Zoológico não foi contemplado nesta ACP.
Audiência com promotores de Justiça e integrantes da SEMA, no Foro Central. Foto: Cleber Dioni Tentardini
A ACP foi assinada por quatro promotores – Ana Maria Marquesan, Annelise Steigleder, Josiane Camejo e Alexandre Saltz – e tem mais de 60 páginas com os argumentos para justificar a manutenção dos servidores e das atividades de pesquisas e conservação das coleções científicas, além de garantir a integridade da área e dos bens imóveis.
juiz e promotora de justiça durante inspeção ao acervo do MCN. Foto: Divulgação MPRS.Bióloga Vera Werner mostra catálogo de algas a promotoras de Justiça.
“Além de constituir o maior acervo de material-testemunho da biodiversidade dos ecossistemas terrestres e aquáticos do Estado, ferramenta imprescindível para estudos que envolvam a flora e a fauna, recente e fóssil, vinculados ao Museu de Ciências Naturais, essas coleções subsidiam a descrição de novas espécies. Os ‘exemplares-tipo’ dessas coleções, que servem de base para as descrições, tornam-se essenciais para a identificação precisa de cada espécie e sua conservação futura na natureza.
“Os acervos científicos são, portanto, bibliotecas da biodiversidade.”
Essenciais para a expansão do conhecimento por meio da pesquisa e da educação. Estudos que envolvem taxonomia, biotecnologia, biogeografia, perda e conservação da biodiversidade, invasões biológicas e mudanças climáticas, por exemplo, dependem das coleções biológicas. As coleções paleontológicas, por sua vez, são de grande relevância do ponto de vista científico e cultural para a reconstituição de paleoambientes e o entendimento da paleoecologia”, descrevem os promotores na ACP.
Promotores de Justiça inspecionam o Herbário Has, no MCN. Foto Divulgação MP-RS
O documento lista uma série de consequências do ponto de vista científico para o Rio Grande do Sul em caso de “descontinuidade das atividades”. Entre eles, a interrupção da socialização da informação para o mundo científico de um dos três maiores herbários do RS, o Herbário Prof. Dr. Alarich R. H. Schulz (HAS), que possui o maior número de lotes em líquido e tipos nomenclaturais do Brasil.
Jardim Botânico é indivisível, diz MP
O Jardim Botânico de Porto Alegre é um museu vivo com um patrimônio público inalienável, não privatizável, indivisível e que exige o máximo zelo dos gestores públicos na sua preservação para as gerações presentes e futuras, diz a Ação Civil Pública do MP.
Em função desse cipoal de atividades, dizem os promotores, o Jardim Botânico de Porto Alegre está entre os cinco do Brasil que se enquadram na categoria A, o que significa que atende a todas as 16 exigências previstas no artigo 6º da resolução Conama 339/2003. “Entre elas, a primeira e mais importante é possuir quadro técnico-científico compatível com suas atividades.”
Modelo de concessão é criticado pelos ambientalistas
Ambientalistas e servidores do Jardim Botânico de Porto Alegre e do Museu de Ciências Naturais do Rio Grande do Sul estão mobilizados para garantir a integridade do patrimônio das duas instituições.
O futuro das coleções científicas, do mobiliário e da própria área do JB e do MCN é incerto, diante da intenção do governo do Estado em conceder as suas gestões à iniciativa privada.
Desde que foi contratado o BNDES para realizar estudos visando à concessão, representantes da Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura (SEMAI) e da Secretaria Extraordinária de Parcerias (SEPAR) vem ressaltando que “a administração do Museu e Jardim Botânico continuará sob responsabilidade do governo, que manterá a qualidade dos serviços prestados na conservação do meio ambiente”.
Além do BNDES, participaram o Instituto Semeia e o Consórcio Araucárias – Parques Brasileiros, registrado em abril de 2021, em São Paulo, para prestar consultoria em gestão empresarial. O quadro societário é formado por Vitor Amauri Antunes, administrador, SPIN Soluções Públicas Inteligentes Consultoria, Plantar Ideias, Vallya Advisors Assessoria Financeira e Queiroz, Maluf Sociedade de Advogados.
Jardim Botânico e Museu de Ciências Naturais. Foto: CMPA/Divulgação
O biólogo Jan Karel Júnior, presidente da Associação dos Funcionários da FZB, diz que o projeto não demonstra quais e de que forma serão realizadas as intervenções no Museu de Ciências Naturais e como as pesquisas, atividades e o acervo desse órgão serão mantidos se a própria intenção do Governo do Estado de demitir os funcionários especializados do JB e MCN é incoerente com uma proposta de concessão do uso público que promete manter as funções técnicas e de pesquisa sob sua responsabilidade.
“O Poder concedente, no caso o Estado, sem a participação de curadores, pesquisadores e técnicos do JBPOA, não tem condições adequadas para considerar todas as questões necessárias relativas à transição para a concessionária sem colocar em risco o patrimônio ambiental e científico, material e imaterial, representado pelo Jardim Botânico”, completa o representante dos servidores.
O biólogo Paulo Brack, professor do Departamento de Botânica, do Instituto de Biociências da UFRGS, e membro do Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (INGÁ), diz que o Estado vai transferir à futura concessionária uma série de compromissos e exigências técnicas rigorosas do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) para manter a qualificação na categoria “A” do JBPOA, obtida na década passada.
A bióloga Rosana Senna, uma das curadoras, explica que o HAS é um acervo botânico com cerca de 150 mil espécimes da flora gaúcha e 300 tipos nomenclaturais, com coletas que datam desde 1854 até os dias atuais.
“A reforma do telhado do prédio se mostra urgente para sanar os problemas de infiltração da água da chuva nas salas de coleções científicas do Museu. O Estado tem a obrigação de proteger esses registros que contam a história da nossa biodiversidade”, ressalta.
A bióloga Caroline Zank, do Instituto Curicaca, diz que os membros da entidade não são contra as concessões à iniciativa privada, mas exigem transparência e a possibilidade de as ONGs e funcionários das instituições participarem ativamente da elaboração do edital.
“O modelo de edital de concessão que foi à apresentado na primeira consulta pública é omisso em dar garantias sobre a manutenção do patrimônio e, por outro lado, dá uma série de possibilidades de intervenção direta na área do JB e do Museu, onde inclusive permite à concessionária a utilização de prédios e a apropriação das áreas, computadores, softwares e equipamentos que são fundamentais à manutenção das pesquisas e atividades técnico-científicas do JB e do MCN, sem demonstrar claramente de que maneira afetará ou não as atividades desses órgãos”, sublinha Caroline.
Outro ponto em que a bióloga chama a atenção é que o edital possibilita ao Estado alterar o Plano Diretor do JB, colocando em risco o patrimônio.
“O Estado concedeu parte da área da coleção científica viva do JB, composta por espécies ameaçadas de extinção, para o IBAMA utilizar na implantação de um CETAS, sem que houvesse qualquer restrição ou garantia de manutenção desta coleção no local”, critica. Essa área é ocupada por uma coleção da Floresta Ombrófila Mista, com espécies raras e ameaçadas de extinção.
CETAS é o Centro de Triagem de Animais Silvestres. Funcionava junto ao Parque Zoológico e, há seis anos, teve suas funções absorvidas pelo órgão federal sendo transferido para um imóvel na esquina das ruas Baronesa do Gravataí e Miguel Teixeira, na Cidade Baixa.
Aquela área do Jardim Botânico a que se refere Caroline tem entrada pela avenida Salvador França, também – distante cem metros do pórtico principal -, e já foi ocupada por laboratórios químicos da FEPAM. Desocupado e sem vigilância, foi invadido e teve dois prédios saqueados e incendiados. O local foi descontaminado graças ao empenho de 161 mil reais de um fundo gerido pelo Ministério Público. Agora, será cedido pela SEMA ao IBAMA.
O Ministério Público do Estado, através da Promotoria Regional da Bacia do Gravataí, e o Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS) – Campus Viamão fizeram parceria para mapear e analisar as condições das nascentes e suas Áreas de Preservação Permanentes (APPs) do Parque Saint’Hilaire.
A pesquisa inédita está sendo feita por professores e alunos do IFRS, para verificar a situação das mais de 50 fontes de água da unidade de conservação.
É uma equipe multidisciplinar, das áreas de Agronomia, Biologia, Química e Gestão Ambiental da instituição de ensino.
O trabalho atende ao projeto Água para o Futuro, do MP-RS, e conta com o apoio dos servidores do Saint’Hilaire, que auxiliam na localização dos mananciais.
A promotora de Justiça Roberta Morillos Teixeira informa que no mês de agosto irá formalizar um termo de cooperação com a instituição de ensino a fim de planejar ações baseadas nos resultados já obtidos.
“Ações que visem o monitoramento, a proteção e a recuperação dessas nascentes e APP‘s”, anotou Roberta, lembrando que o projeto Água para o Futuro vai e estender para nascentes em outros locais no Estado.
O professor Robson Garcia da Silva, coordenador do curso de Tecnologia em Gestão Ambiental do IFRS-Viamão, diz que já foram analisadas quarenta e cinco nascentes e suas APPs.
“Dentro de vinte parâmetros qualitativos, verificamos cinco nascentes degradadas e meia dúzia moderadamente preservadas. É preocupante, porque estamos dentro de uma unidade de conservação”, observa.
Uma delas é a nascente do Arroio Dilúvio. localizada ao Sul, próxima ao bairro Lomba do Pinheiro, já no município de Porto Alegre.
Análise indica água turva e colorida, com óleo e graxa visíveis. próxima a residências, esgoto e circulação de animais. Fotos Divulgação IFRS
A água está turva e colorida, com óleo e graxa visíveis. Há presença de residências, esgoto e circulação de animais próximo à nascente, portanto, dentro da APP. A vegetação do entorno foi suprimida e há erosão e assoreamento.
As nascentes (vídeo) são responsáveis pela passagem da água subterrânea para a superficial, promovendo o surgimento de arroios, rios e lagos.
Num raio de 50 metros no entorno das nascentes, todo o terreno é uma APP (Área de Preservação Permanente)e que, por lei, também deve ser protegida. A legislação, neste caso, é o Código Florestal, de 2012.
As outras quatro nascentes poluídas no parque drenam para outros arroios e para o reservatório da Lomba do Sabão, que é a única reserva alternativa que Porto Alegre dispõe para abastecimento de água, em caso de acidente no Guaiba, onde a Capital capta toda sua água hoje.
Nascentes e APPs com muito lixo
Lixo na APP
A estudante Tácia Slim, bolsista do projeto no curso de Gestão Ambiental do IFRS Campus Viamão, é quem está organizando os dados, sob a orientação dos professores Robson, Adriano Andrejew Ferreira, Ariela Milbrath Cardoso, Claudio Henrique Kray e Rosana Serpa.
Gerson e Francisco,, funcionários do parque (nas extremidades) com Robson, Rosana e Adriano, do IFRSTácia (no meio, de preto), com professores
Ela apontou que boa parte dos impactos que tem causado degradação está relacionada à disposição de resíduos sólidos, invasões, desmatamento, queimadas e presença de vegetação exótica (eucalipto, pinus e outras) em cada nascente e sua APP.
Localização de nascentes
UC inclui mata atlântica, campo nativo, butiazais e banhados
Os documentos registram 1.148 hectares, mas, hoje, perdeu 10 hectares – fatia doada ao governo do Estado para instalar uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) -, e outros 50 hectares de áreas invadidas para habitação. As ocupações irregulares começaram nos anos de 1940. Nesse novo mapa do parque de Viamão, a Prefeitura já deixou fora essa área ocupada por moradias. Do total, restaram 1.088ha.
O nome homenageia o naturalista e viajante francês Augustin François Cesar Provensal Saint´Hilaire, que registrou os aspectos sociais e naturais do Rio Grande do Sul em seu livro Viagem ao Rio Grande do Sul, de 1820.
A vegetação é composta por 450ha de mata nativa, associado ao Bioma Mata Atlântica, e cerca de 300ha de campo nativo, incluindo áreas de butiazais e banhados. O butiazal é uma formação altamente ameaçada de extinção no Rio Grande do Sul, devido à expansão urbana, agrícola e pecuária.
Butiazais em área de campo nativo do parque. Foto: Cleber Dioni Tentardini
A Embrapa Clima Temperado de Pelotas inseriu o butiazal do Parque Saint’Hilaire na Rota dos Butiazais, que inclui Argentina, Uruguai, Rio Grande do Sul, até Santa Catarina.
A floresta de eucaliptos existe desde 1944, antes da criação do parque. O recalque da água utilizava a madeira para gerar energia, motivo pelo qual a antiga Companhia de Abastecimento plantou variedades sobre as áreas de campo nativo no Saint’Hilaire.
Banhado no Arroio Taquara. Foto: Cleber Dioni Tentardini
Em setores de planície de inundação em que se processa o extravasamento de águas pluviais, obtém-se banhados.
No parque, eles se formaram, principalmente, depois da construção da Barragem Lomba do Sabão. É uma área rica em produtividade primária e um refúgio para nidificação de diversas espécies.
No Plano de Manejo feito em 2002, foram identificadas no parque 56 espécies vegetais distribuídas em 27 famílias. Estima-se que esse número ultrapasse as 161 espécies e 54 famílias. Entre as espécies vegetais ameaçadas, destacam-se a canela-preta e, em vias de extinção, a corticeira da terra e as figueiras.
Em 2018, alunos dos cursos de Biologia da UFRGS e PUCRS fizeram um levantamento da flora do parque. São 13 páginas com vinte plantas em cada. Está disponível na internet. Confere aqui a lista completa.
O parque é um refúgio para a fauna da região metropolitana, com uma biodiversidade composta por 12 espécies diferentes de mamíferos, dentre eles graxaim, ouriço, gambá e mão-pelada, 47 espécies de répteis (cobras, lagartos, lagartixas), 23 de anfíbios (sapos, pererecas e rãs), 14 espécies de peixes que habitam a barragem e 88 espécies de aves, sendo que quatro estão ameaçadas de extinção: chupa-dente, patinho, cisca-folha e choca-da-mata.
Fontes abasteceram a Capital por mais de quatro décadas
O Parque Natural Municipal Saint’Hilaire serviu por mais de quarenta anos como a principal fonte de abastecimento de água dos moradores de Porto Alegre, através de suas mais de cinquenta nascentes.
Somente na década de 1940, foi construída a Barragem da Lomba do Sabão, um reservatório para captação com 75 hectares de lâmina d’água. Era tratada e bombeada para um reservatório que havia ao lado da Praça da Matriz, onde hoje está o prédio do Parlamento gaúcho, e distribuída aos moradores. Depois, o reservatório foi transferido para a Hidráulica Moinhos de Vento, a fim de atingir uma fatia maior da população. Hoje, não há mais captação na barragem.
Algumas nascentes são as cabeceiras do Arroio Dilúvio (vídeo), que drenam para a várzea, na avenida Ipiranga, e deságuam no Guaíba, possuem papel fundamental na conservação daquela bacia hidrográfica, uma região densamente povoada, onde estima-se que moram 500 mil pessoas.
“É indiscutível a importância de ter uma unidade de conservação com mais de mil hectares na Região Metropolitana. É um refúgio, sem falar na proteção aos mananciais”, diz o engenheiro florestal Gerson Mainardi, responsável técnico pelo Parque, na área da Capital.
A bacia hidrográfica do Arroio Dilúvio, região densamente povoada com cerca de 500 mil pessoas.
Desde 1944, o parque pertencia ao município de Porto Alegre, apesar de estar em Viamão. Mas um projeto de Lei (PL 05/2022), aprovado no dia 27 de janeiro de 2022 pela Câmara Municipal autorizou Viamão assumir o Parque nos limites de seu território, 908 hectares, que correspondem a cerca de 82%.
A proposta foi aprovada no final de 2022 pela Câmara Municipal de Porto Alegre, assim, a Prefeitura passou a gerenciar apenas a parte da unidade de conservação que está em sua área, 18%. Juridicamente, existem dois parques. Discute-se, agora, novos Planos de Manejo para redefinir as áreas de preservação e de acesso público, caso seja permitido.
Reprodução Google Earth
Paleotocas estão inacessíveis
Pesquisadores do Projeto Paleotocas, do Instituto de Geociências da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), entre os anos de 2008 e 2018, cadastraram mais de mil dessas estruturas cavadas por animais da mega-fauna pré-histórica no Brasil e produziram mais de 80 trabalhos científicos sobre o tema.
No Rio Grande do Sul, foram encontradas em mais de vinte municípios, incluindo Porto Alegre e Viamão. As paleotocas são comuns ao redor da base dos morros.
Paleotoca no Saint Hilaire
No Parque Saint’Hilaire, as sete escavações dos animais pré-históricos encontradas até agora estão inacessíveis porque tiveram partes desabadas. As fotos feitas com os pesquisadores no interior das tocas são na Fazenda Refúgio, em Viamão.
Na fazenda Refúgio, em Viamão.Fotos: Instituto Geociências/ UFRGS
“Nosso conhecimento sobre os animais que produziram essas estruturas avançou pouco. Acreditamos que tenham sido feitos por tatus gigantes, com 250 quilos de peso, e preguiças gigantes, que partiam de 800 quilos”, estima o coordenador do projeto, o professor do Instituto de Geociências da UFRGS, Heinrich Theodor Frank.
Em muitos abrigos, há marcas padronizadas nas paredes, produzidas por garras de animais. Eles viveram na época do Pleistoceno, no período geológico Quaternário, entre 1,8 milhão a 11.000 anos atrás.
O molde do crânio do Glossotherium, preguiça gigante, e o crânio do Propraopus grandis, tatu gigante, do Acervo Paleontologia Museu de Ciências Naturais/SEMA. Ilustrações: Renato P. Lopes, do Projeto Paleotocas
Parte do dedo e unha de uma preguiça gigante. Acervo Paleontologia Museu de Ciências Naturais/SEMA
A maioria apresenta cerca de 1,3 metro de diâmetro. As mais imponentes podem chegar a 2 metros de altura e 4 metros de largura. Os túneis chegam a 40 metros de comprimento, e até mais. As marcas e vestígios deixados por animais e vegetais de outras épocas geológicas em sedimentos e rochas são denominadas de icnofósseis.
A datação exata das paleotocas é considerada impossível, uma vez que o terreno no qual foram escavadas é composto de rochas muito mais antiga do que esses abrigos. Admite-se, porém, que por estarem situadas perto da superfície, tenham aparecido há menos de 500 mil anos.
*Colaboraram nesta série de reportagens o repórter fotográfico Ramiro Sanchez e os jornalistas Elmar Bones e José Barriunuevo.
Não existe uma unidade de conservação no Rio Grande do Sul com a mesma diversidade de ecossistemas do Parque Estadual de Itapuã (PEI), que completa 50 anos neste 14 de julho.
Localizado na zona de transição entre os biomas Mata Atlântica e Pampa, o parque abrange ilhas, lagoas, praias, banhados, dunas, vegetação de restinga, floresta estacional e morros graníticos, distribuídos em 5.566 hectares.
Diferente de uma estação ecológica ou de um refúgio de vida silvestre, onde são permitidos visitantes somente para educação ambiental e pesquisa científica, a área é de uso público. Especialmente no verão, quando a população busca a calmaria das suas praias com águas balneáveis.
São nove praias: das Pombas, da Pedreira, da Onça, do Araçá, do Sítio, do Tigre, do Cascalho, de Fora e Prainha. Mas apenas as duas primeiras estão abertas. A Praia de Fora aguarda obras de infraestrutura. As demais têm limitações de acesso.
Praias da Pedreira, de Fora e das Pombas (abaixo, na sequência)) são as que, normalmente, estão liberadas para uso público. Fotos: Cleber Dioni Tentardini
No parque, são encontrados animais como leão baio (puma), graxaim, ema, capivara, carcará, jacaré, serpente, bugio-ruivo, tuco-tuco, gato maracajá, 29 espécies de anfíbios, 39 espécies da flora endêmicas e com um algum grau na lista de espécies ameaçadas de extinção, como o topete de cardeal e a corticeira do banhado.
Caranguejeira.Graxaim. Fotos: Mariano Pairet/SEMA
OuriçoPuma captado por armadilha fotográfica
A bióloga Dayse dos Santos Rocha, analista ambiental da SEMA, assumiu a gestão da unidade faz seis anos e diz que trabalhar em uma área de preservação como essa, onde é permitida visitação pública, é um desafio diário para coibir atropelamentos dos animais, invasões, caça e pesca ilegais, supressão de árvores, subtração de plantas, pedras.
Dayse Rocha, a gestora do Parque Estadual de Itapuã/ Cleber Dioni
“O nosso trabalho é focado na conservação dos ecossistemas, pesquisa científica, uso público e educação ambiental. Temos que ser versáteis para conversar com escolas, pescadores, assentados, indígenas, pesquisadores, produtores rurais”, destaca a bióloga.
Segundo a gestora, já convenceram dois produtores convencionais a plantar o arroz orgânico no entorno da unidade.
– É importante essa redução do uso de pesticida na água, que vai para o solo, contamina as águas subterrâneas, enfatiza.
Ambientalistas salvaram a reserva
Itapuã significa ponta de pedra, na língua Guarani. Os primeiros habitantes de Itapuã foram os povos indígenas de tradição Umbu e Guarani.
Granito em abundância. Foto: Cleber Dioni
A extração do granito de Itapuã foi muito grande na década de 1960 e só não continuou porque a Agapan (Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural), liderou uma campanha nos anos de 1970 para transformá-lo numa reserva ecológica.
– Aquilo é uma das paisagens mais bonitas e ricas do mundo. Mas estava praticamente abandonada. Tinha mais de trinta pedreiras atuando nos morros. Felizmente, parece que vamos conseguir impedir a destruição, disse José Lutzenberger, depois de realizar uma inspeção de rotina no parque de Itapuã, nos anos 1990, na época uma área de 1.500 hectares.
Parque Estadual de Itapuã, Lago Guaíba e Ilha do Junco (à dir.) e Lagoa Negra e Laguna dos Patos (à esq.). Google Earth
Hilda Zimmermann, uma das ativistas mais importantes do movimento ecológico do RS, registrou que havia muita extração de pedras e areia, pesca e caça predatórias. “Certa que certa vez fomos em dois ônibus e convidamos a imprensa para ir ver as pedreiras de Itapuã, que eram exploradas por um ministro de Brasília. Parem as marteladas, gritávamos. Saiu na primeira página um homem com cara de apavorado e eu com as mãos na cintura”, lembrou Hilda no livro Pioneiros da Ecologia (Editora JÁ).
Vista das praias do parque, a partir do Morro da Fortaleza. Foto: Cleber Dioni
A área foi declarada de utilidade pública em dois momentos, nos anos de 1973 e 1976.
O Parque Estadual de Itapuã (PEI) foi transformado em uma unidade de conservação de proteção integral do Estado somente em 1991, já com 5.566 hectares, incluindo a Lagoa Negra. Dois anos depois, incorporou as ilhas das Pombas, do Junco e da Ponta Escura.
Pesquisadores da SEMA na Lagoa Negra, dentro do Parque de Itapuã. Fotos: Cleber Dioni Tentardini
Detalhe: a gestão era feita pela Secretaria de Agricultura e Abastecimento, pois não havia órgão específico do Estado para cuidar do meio ambiente.
Unidade foi fechada para retirada de moradias
Até 1990, havia 880 casas com moradores dentro do Parque de Itapuã. As praias recebiam ônibus turísticos aos finais de semana. A Praia das Pombas, por exemplo, que suporta 350 visitantes, chegava a ter mil pessoas.
“Lotearam, venderam terrenos e transformaram a reserva em um balneário, sem nenhum regramento sob aspectos ambientais. Isso, associado à extração do granito”, ressalta a gestora Dayse Rocha.
A desocupação começou em 1991, com o parque interditado para demolição das casas. O Estado indenizou os donos de imóveis regulares, com escrituras, e muita gente entrou em negociação com o governo. Dívidas viraram precatórios e algumas ainda não foram pagas.
“Isso explica, em parte, um certo inconformismo das comunidades do entorno com o Parque. Também, porque cortamos a extração de granito, a entrada de milhares de veranistas, coibimos a caça, a pesca predatória, especialmente na época da piracema (subida dos peixes nos rios para a reprodução), também chamada de período do defeso, a lei que protege as espécies.
Além disso, reclamamos dos resíduos sólidos deixados na praia externa ao parque, dos pesticidas nas lavouras”, explica Dayse. O parque foi reaberto em 2002 e vem se recuperando bem, segundo a gestora.
Aspilia montevidensisBroméliaCattleya intermediaDickiaGravatáMamica de cadela
Farol garante segurança aos navegadores, iluminando mais de 22 quilômetros. Foto: Cleber Dioni Tentardini
A reportagem saiu de lancha, do terminal do Catamarã, em frente ao Mercado Público de Porto Alegre, em direção a Viamão, passando pelo Parque Estadual de Itapuã, pelo Farol, até entrar na Laguna dos Patos.
É uma das maiores do Brasil, com cerca de 300 km de comprimento e margens baixas. A profundidade máxima é de 7 metros. Diz-se que seu nome é proveniente da tribo dos índios patos, que habitavam a região. Atualmente, abriga uma ativa comunidade pesqueira.
Está separada do mar por uma faixa arenosa, com largura que varia de 10km a 36km. Diversas cidades desenvolveram-se às margens da lagoa e dos rios que ali deságuam, dentre elas, Porto Alegre, Pelotas e Rio Grande.
Na condução da lancha, Hugo Eugenio Fleck, empresário do setor de transportes terrestre (Ouro e Prata) e fluvial (Catamarã), e um auxiliar.
Gaúcho de Crissiumal, Fleck acumula experiência de 60 anos de navegação em vários países. Começou aos 15 anos, com um barco comprado pelo seu pai, navegando justamente pelas águas do Delta do Jacuí e do Guaíba.
Hugo Fleck navega desde criança pelo Guaíba. Foto: Cleber Dioni Tentardini
“Pela costa da Capital, em direção à zona Sul, só é possível atracar em dois clubes náuticos ou no ponto de embarque e desembarque do Catamarã, em frente ao Barra Shopping. Agora liberaram outro terminal no Pontal do Estaleiro, mas a burocracia é muito grande, demora uns cinco anos para aprovarem”, lamenta Fleck.
Passava das 9h, e o vento começara a virar do Norte para o Sul. Segundo Fleck, o microclima da região pode provocar ondas.
Ele também estava preocupado com os bancos de areia e as redes, levando em conta a sinalização deficitária. “As pedras são um problema somente próximo à terra firme, explicou o empresário.
Na travessia, é possível avistar os bairros Assunção, Ipanema, Ponta Grossa e Belém Novo até chegar em Viamão. Passados clubes náuticos, pequenas enseadas particulares e as praias da unidade de preservação, surge o Farol de Itapuã e, logo, a Laguna dos Patos. Alguns barcos com pescadores emolduravam a paisagem
Proximidades do farol são locais preferidos dos pescadores. Foto: Cleber Dioni Tentardini
Atrás do Farol, embora encobertas pela mata, ainda podem ser vistas ruínas de um pequeno forte erguido pelos Farrapos para barrar a entrada dos inimigos do Império.
Pouco antes do meio-dia, o barco ancorou na Colônia de Pescadores e Agricultura Z4, em Itapuã, distrito histórico, à beira da Prainha, onde moradores e turistas têm à disposição escolas, igrejas, agências bancárias, lojas, bares e restaurantes, supermercados, posto policial, além de clube náutico e pousadas.
Farol ilumina até 22km
Farol de Itapuã da Lagoa. Foto: Egon Filter
Desde o início do século 19, os navegantes que se aventuravam por suas águas ressentiam-se da ausência de referências visuais que os ajudassem a alcançar aqueles portos em segurança. Requisitavam um farol, sobretudo, para a Ponta de Itapuã, que sinalizaria a foz do Guaíba, e o acesso a Porto Alegre.
Inaugurada somente em março de 1860, a torre de alvenaria tem forma octogonal, e mede 16,25 metros de altura. A sua volta ficam as casas dos faroleiros, protegidas do vento e das águas da lagoa por um paredão de pedras. Pintadas de branco, as construções contrastam com a vegetação e as pedras da Ponta de Itapuã, formando um dos cenários mais bonitos da Laguna dos Patos.
Construção cercada de pedras e vegetação do Parque Estadual de Itapuã. Foto: Cleber Dioni
Em 1903, após 40 anos de funcionamento, o obsoleto aparelho luminoso de Itapuã foi substituído por um Barbier, Benard & Turenne, com queimadores de vapor de petróleo comprimido.
Em 1914, uma comissão da Superintendência de Navegação aprovou, por unanimidade, o emprego de um revolucionário sistema de iluminação automático com gás acetileno.
Farol de Itapuã da Lagoa. Foto: Egon Filter
A partir de 1915, Itapuã da Lagoa, já modernizado, dispensava a assistência permanente do faroleiro.
Hoje, são utilizadas baterias como fonte de energia, e estas, alimentadas durante o dia por painéis solares (energia fotovoltaica).
baterias como fonte de energia, que são alimentadas por painéis solares. Foto: Cleber Dioni
O farol possui uma lanterna de lente de acrílico com um eclipsor no interior. Eclipsor é um dispositivo eletrônico.
O alcance luminoso é de 12 milhas náuticas, mais de 22km, suficiente para iluminar toda a foz do Guaíba. O acesso se dá somente pela água. A operação é de responsabilidade da Marinha do Brasil.
Vestígios farroupilhas no Morro da Fortaleza
A reportagem percorreu a trilha Fortaleza, um dos três percursos oferecidos pela administração do parque.
Godoy
O educador ambiental João Godoy Fagundes guiou a equipe em uma caminhada de quase três horas, levando em conta as paradas para fotos, vídeos, apontamentos da fauna e flora e de registros históricos.
A subida é íngreme em vários trechos dessa trilha e exige um bom preparo físico. O ronco dos bugios acompanha os visitantes durante quase todo o trajeto.
No caminho, há vestígios das trincheiras onde os soldados ficavam à espreita das tropas inimigas. Os Farrapos dominaram Viamão por quase toda a guerra. Tanto é que foi rebatizada de Vila Setembrina, 1838. E os morros permitiam uma visão ampla da região.
Morro da Fortaleza, onde os Farrapos posicionaram a artilharia para barrar a passagem dos imperiais. Fotos: Cleber Dioni Tentardini
Vestígios das trincheiras
O líder dos farroupilhas, general Bento Gonçalves da Silva, tinha raízes em Viamão. Sua mãe, Perpétua da Costa Meireles, nasceu e foi batizada no município, e seu bisavô, Jerônimo de Ornellas Menezes e Vasconcellos, povoou os campos de Viamão a partir de 1732.
Livros contam que os insurgentes posicionaram canhões no topo do Morro da Fortaleza voltados para um trecho do Guaíba defronte à Ilha do Junco a fim de impedir a passagem dos navios imperiais provenientes da Laguna dos Patos rumo à Porto Alegre.
Em 1836, uma força imperial conseguiu desembarcar na praia das Pombas – chamada de Saco do Faria, na época – e seguiu por terra até a Fortaleza, onde as refregas provocaram 32 mortes e vários foram presos. O comandante farrapo Simão Barreto teria sido colocado pelos legalistas no cais da vela de um dos barcos, onde morreu.
Balas de canhão, adagas, espora encontradas nas praias do parque
Foram encontradas balas de canhão, adagas, espadas, ganchos, até esporas, indicando que os revolucionários ocuparam os morros também a cavalo. Muitos desses materiais estão no museu do parque estadual. Outros, ficaram soterrados ou perdidos em meio à mata, de difícil acesso.
Há ruínas da época dos Farrapos também atrás do Farol de Itapuã, na embocadura do Guaíba.
Passo do Vigário
Em uma das escaramuças morreu o revolucionário italiano Luiz Rossetti, um dos principais redatores do jornal O Povo, órgão oficial da República Riograndense.
Carbonário e companheiro de Garibaldi, Rosseti, foi vítima de uma lança*, durante a tomada de Viamão pelos imperiais no dia 24 de novembro de 1840, na Batalha do Passo do Vigário (*site Viamão Antigo, editado por Paulo Lilja).
*Colaboraram nesta série de reportagens o repórter fotográfico Ramiro Sanchez e os jornalistas Elmar Bones e José Barriunuevo.
São 136 mil hectares, área maior que o município de Porto Alegre, de terras alagadiças que encerram o segredo de uma biodiversidade única, na transição da Mata Atlântica para o Pampa.
Em três banhados interligados (Banhado Grande, Banhado do Chico Lomã e Banhado dos Pachecos), porções de terras baixas onde se acumulam as águas de vertentes e das chuvas, que descem das últimas elevações da Serra do Mar.
O maior deles, o Banhado Grande dá nome à Área de Proteção Ambiental (APA), criada em 1998 para protegê-los do avanço das lavouras, da caça predatória e até da mineração. É considerada santuário de biodiversidade e “berçário” das espécies que habitam a região.
A área de preservação se estende por quatro municípios: Viamão (36%), Santo Antônio da Patrulha (33%), Glorinha (24%) e Gravataí (7%).
Uma das nascentes do rio Gravataí, no Banhado Grande, chamado de Rio Guará, uma zona de uso restrito. Foto: APABG/SEMA
Das águas que eles acumulam, como uma esponja, se alimenta o Rio Gravataí, um dos principais afluentes do Guaíba, responsável pelo abastecimento de 1,2 milhão de pessoas na Região Metropolitana de Porto Alegre.
– O desafio é compatibilizar as atividades de criação de gado, das lavouras de arroz e, cada vez mais, da soja, enfim, os múltiplos usos no território, com a conservação, diz a gestora da APABG, a engenheira agrônoma Letícia Rolim, da Secretaria de Meio Ambiente do Estado.
As lavouras de arroz, por exemplo, que ocupavam a quase totalidade das terras planas da região – plantações irrigadas, com poucas pragas, necessitando menos venenos – causavam impacto menor.
Mas os produtores estão trocando o arroz pela soja, por causa dos lucros e do mercado internacional.
Além de mais defensivos, a soja exige a drenagem das áreas úmidas, o que afeta todo o ecossistema dos banhados, segundo a analista ambiental.
Lavouras de arroz dentro da APABG. Foto: Cleber Dioni Tentardini
– A pecuária também é atividade importante no entorno, dada a abundância de pastos e aguadas. Mas o gado não prejudica as áreas úmidas, a não ser quando a lotação do campo é alta. Aí, o pisoteio de muitos animais causa erosão e drena o banhado, ressalta.
Foto: Divulgação APABG
Um plano de boas práticas agropecuárias para orientar os produtores e reduzir o uso desses químicos está em desenvolvimento pelo Conselho Gestor.
– Precisamos criar regras que não existem no plano de manejo da APABG para conseguirmos trabalhar algumas áreas sensíveis do Banhado Grande, como a recuperação de áreas úmidas, na zona de adequação ambiental, explica a gestora da UC.
Letícia, gestora da APABG, com o colega da SEMA, o biólogo André Osório, gestor do Refúgio de Vida Silvestre Banhado dos Pachecos. Foto: Cleber Dioni TentardiniBióloga Cecília Nin, em fiscalização da APABG
– Um dos problemas mais sérios é o uso de agrotóxicos em lavouras no entorno da unidade de conservação e até dentro dela, reforça a bióloga Cecília Nin, analista ambiental da APABG.
MAPA DO BANHADO GRANDE
Área de Proteção Ambiental (APA) do Banhado Grande abrange136.935 hectares, que se estendem por quatro municípios: Viamão (36%), Santo Antônio da Patrulha (33%),Glorinha (24%) e Gravataí (7%). Foi criada em 1998, mas só nos últimos dez anos ganhou um plano de manejo para garantir sua preservação. A gestão de toda a área de conservação é coordenada pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente.
Um rio nos extremos
São límpidas as águas do Gravataí quando ele nasce nos banhados em Viamão. Dali, ele percorre 29 quilômetros até desembocar no Delta do Jacuí.
Banhado Chico Lomã, um dos que abastecem o rio Gravataí. Fotos: APABG/SEMAÁgua límpida num dos arroios que drenam para Banhado Chico Lomã.
A reportagem tentou navegar por toda a extensão, mas não foi possível devido ao nível baixo do rio.
O Gravataí atravessa uma região de lavouras, fábricas e moradias, que utilizam sua água e nele jogam seus dejetos. No ponto de chegada, quando entram no estuário, as águas carregam uma carga tóxica que faz dele o quinto rio mais poluído do Brasil.
Lagoa da Anastácia, planície de inundação do rio Gravataí. Zona de Adequação Ambiental. Foto: APABG/SEMA
Último refúgio
Quatro anos depois de criada a APABG, os gestores se deram conta de que uma das áreas de preservação merecia uma atenção especial.
Era a menor delas, com 2,5 mil hectares de área, mas a mais rica em diversidade e a mais ameaçada.
Foi criado, então, o Refúgio de Vida Silvestre Banhado dos Pachecos (RVSBP).
Refúgio coberto de névoa. Foto: André Osório/SEMA
O nome vem da família Os Pachecos, dona de uma das primeiras sesmarias dos “Campos de Viamão”.
Em 1998, quando o empresário Renato Ribeiro vendeu a propriedade para o Incra, eram 10 mil hectares. O Incra dividiu a área em lotes menores e neles assentou trabalhadores sem-terra.
Hoje, o Assentamento Filhos de Sepé, é o maior do Estado, em extensão, e o maior produtor de arroz orgânico da América Latina.
O refúgio foi criado a partir da doação de uma fração de terras de cada assentado.
RVSBP abriga também espécies ameaçadas de extinção. Foto: Mariano Pairet/SEMA
Nesses 20 anos, pesquisadores e monitores já catalogaram mais de 283 espécies de aves, inclusive algumas raras.
Glayson Bencke, do MCN/SEMA
Pelo menos nove estão ameadas de extinção, como o veste-amarela, o guaracavuçu, o curiango-do-banhado e noivinha-de-rabo-preto, segundo o biólogo Glayson Bencke, do Museu de Ciências Naturais, da Secretaria Estadual do Meio Ambiente (MCN/SEMA)
Veste-amarela, Veste-amarela. Fotos: André Osório/SEMACardeal-do-banhadoCuriango-do-banhadoVeste-amarela. Foto: Mariano Pairet/SEMA
Entre os mamíferos, estão no refúgio os últimos cervos do Pantanal que restam no Rio Grande do Sul. “Calculamos cerca de 30 indivíduos”, afirma o gestor do refúgio, o biólogo André Osório, da SEMA. Também o gato maracajá, gato do mato, tamanduá, bugio ruivo e tuco-tuco do Lami, outros em perigo de extinção em âmbito regional.
Bugios Foto: Mariano Pairet/SEMACapivaras. Foto: André Osório/SEMAOuriço
Tuto-Tuco do Lami. Foto André Osório/RVSBP/SEMABiólogo Martin Molz, do MCN/SEMA
Dentre as espécies da flora criticamente ameaçadas de extinção, encontradas no Refúgio, segundo o biólogo Martin Molz, do MCN/SEMA, estão a Persea venosa (pau-andrade), do gênero do abacate, e Butia catarinensis (butiá-da-praia).
A Stenachaenium macrocephalum (foto abaixo) não possui dados suficientes na listagem estadual, mas está criticamente ameaçada de extinção a nível nacional, assegura a bióloga Rosana Senna, do MCN/SEMA.
Foto: Cleber DioniBióloga Rosana Senna/MCN/SEMA
Duas espécies de peixes, endêmicas do banhado, também são raras, como o “peixe anual”, cujo ciclo de vida é muito curto.
– O refúgio é o único lugar do mundo onde essa espécie foi encontrada, afirma o biólogo Marco Azevedo, do MCN/SEMA.
Biólogo Marco Azevedo. Fotos: Cleber DioniPeixe anual encontrado só no Refúgio
Estudos identificaram dentro do refúgio dois tipos de mata, a floresta de restinga arenosa e a mata paludosa, adaptada às áreas de banhado, importante para espécies ameaçadas. Também foi feito um estudo da vegetação do campo e das áreas úmidas e ali se identificou muitas espécies.
Além de Osório, há guarda-parques, voluntários e bolsistas/estagiários para colocar em prática o plano de manejo, homologado somente este ano de 2022.
Os cervos do banhado
Ele é conhecido como “cervo do Pantanal”, um dos maiores mamíferos terrestres do Brasil, uma das espécies ameaçadas que sobrevivem no Refúgio de Vida Silvestre Banhado dos Pachecos.
Espécie nativa do RS foi sumindo com a degradação das áreas onde vive. Foto: André Osório/SEMA
O nome gera confusão porque, além do Pantanal, onde é mais numerosa, essa espécie é nativa do Rio Grande do Sul, sempre ocorreu em várias regiões como Planície Litorânea, Central, Sul, Campanha.
Foi desaparecendo em função da degradação das áreas úmidas, dos banhados, onde ele vive.
Mata Paludosa, típica de banhados. Foto: André Osório/RVSBP/SEMA
Pelos registros feitos com armadilhas fotográficas, Osório calcula que existam ali cerca de 30 indivíduos, incluindo filhotes, o que indica que a população está crescendo.
Outro indivíduo. Fotos: André Osório/RVSBP
O gestor conta que os especialistas em mamíferos ficaram surpresos com a capacidade de sobrevivência desse animal numa área de grande pressão como é a região metropolitana de Porto Alegre.
Biólogo André Osório, gestor do RVSBP. Foto: Cleber Dioni
“O cervo vem mudando o comportamento, provavelmente por estar ilhado. O padrão de atividade diária desse animal é final de tarde e à noite. Diferente de populações que vivem no Pantanal ou em países como a Argentina, por exemplo, que têm hábitos diurnos. Outra adaptação dele é que passou a se alimentar de folhas de Maricá, além das plantas aquáticas”, conta o gestor do refúgio.
Refúgio Banhado dos Pachecos, com a represa do assentamento ao fundo. Foto: Cleber Dioni
População rejeitou aterro sanitário
A prefeitura de Viamão propôs no ano de 2020 instalar um aterro sanitário regional em uma área de 170 hectares às margens da Rodovia Coronel Acrísio Martins Prates, localizada nos Montes Verdes, zona rural do município.
Manifestação contrária á instalação do aterro em frente à fazenda nos Montes Verdes. Foto: Lawrin Ritter
O projeto da Empresa Brasileira de Meio Ambiente (EBMA), com sede no Rio de Janeiro, ligada ao Grupo Queiroz Galvão, solicitou o zoneamento, uso e ocupação do solo da área, e liberação para remanejar o fauna silvestre a fim de receber rejeitos de 28 cidades, inicialmente.
A mobilização para barrar o processo começou com o Movimento Não ao Lixão, e logo ganhou a adesão das comunidades.
Na Câmara Municipal de Viamão.Protestos invadiram as ruas. Foto: Lawrin Ritte
“A prefeitura estaria permitindo um crime socioambiental ao liberar a criação de um lixão com rejeitos de 28 cidades, podendo chegar a 50 cidades, em uma área com oito nascentes de água”, ressalta a professora Iliete Citadin.
A Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luis Roessler (Fepam) negou prorrogar o prazo de entrega do Estudo de Impacto Ambiental a fim de receber licença previa de instalação.
Impactos seriam devastadores, aponta estudo da UFRGS
Professores, pesquisadores e alunos da UFRGS participaram de um projeto de extensão universitária para analisar os recursos naturais e uso do solo em Viamão, nos distritos do Passo da Areia, Espigão e Itapuã. A equipe foi coordenada pela professora e pesquisadora Maria Luiza Rosa, do Instituto de Geociências, com a consultoria do professor Pedro Antônio Reginato, do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH).
O relatório técnico-científico concluiu que a localização da Fazenda Montes Verdes apresenta fragilidade geológica e geomorfológica a processos erosivos muito fortes e é imprópria para receber um aterro. E que o aterro causaria impactos devastadores ao meio ambiente porque a região está em área de recarga dos sistemas aquíferos, e há possibilidade de vazamentos no solo podendo atingir redes de drenagem com sentido ao Lami (lago Guaíba), Itapuã (lago Guaíba) e nascentes do Rio Gravataí.
Foram citados também as nove unidades de conservação no entorno: cinco Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN Costa do Serro, RPPN Rincão das Flores, RPPN Chácara Sananduva, RPPN Farroupilha e RPPN Professor Delmar Harry dos Reis), a Área de Proteção Ambiental (APA) do Banhado Grande, o Refúgio da Vida Silvestre (RVS) Banhado dos Pachecos, a Reserva Biológica Municipal (RBM) José Lutzemberger (do Lami) e o Parque Estadual de Itapuã.
“Os efluentes lixiviados na área impactariam a rede de drenagem do Arroio Chico Barcelos, onde predominam chácaras, hortifrutigranjeiros e pecuária em propriedades de pequeno porte, além da comunidade Mbya Guarani da Tekoá Jataí’ty (Aldeia do Cantagalo), que faz uso da água de um afluente desde arroio. Atividades como dessedentação animal, irrigação e eventuais atividades recreativas seriam diretamente afetadas. Além disso, a Praia do Lami, local onde a qualidade da água do lago Guaíba é própria para banho também seria impactada. Assim como os impactos recairiam diretamente nas atividades de rizicultura, pecuária e no abastecimento urbano dos municípios de Viamão, Alvorada e Gravataí, que compõem uma população de mais de 660 mil habitantes urbanos.”
Aquíferos têm água de excelente qualidade, mas são vulneráveis
A geóloga Luísa Collischonn está desenvolvendo a sua tese de doutorado na região da Coxilha das Lombas, que envolve Viamão e Santo Antônio da Patrulha. O título do projeto da tese é “Compartimentação Hidroestratigráfica do Sistema Aquífero Barreira Marinha, noroeste da Planície Costeira do Rio Grande do Sul”.
Geologia e hidrogeologia do Sistema Aquífero Coxilha das Lombas. Fonte: CPRM, 2005-2006Coxilha das Lombas: Aquífero subterrâneo e o Banhado Chico Lomã ao fundo. Foto: Ramiro Sanchez
O Sistema Aquífero Barreira Marinha também é conhecido como Coxilha das Lombas.
Luísa integra o grupo que está desenvolvendo o Atlas Socioambiental de Viamão. Ela explica que o aquífero teve origem há cerca de 325 mil anos, quando o mar estava aproximadamente 15 metros acima do atual, chegando até Viamão.
A geóloga Luísa Collischonn/Divulgação
“Da mesma forma como hoje temos campos de dunas em Cidreira, Mostardas e em outros tantos locais do litoral gaúcho, também havia um campo de dunas em Viamão, e são principalmente os seus depósitos sedimentares (paleodunas) que hoje formam o aquífero que conhecemos como Coxilha das Lombas”, afirma.
De acordo com a geóloga, os sedimentos arenosos que formam o aquífero são compostos principalmente por quartzo (o mesmo que predomina nas praias gaúchas atuais), com grãos arredondados, que foram moldados pelo vento, e grãos mais finos, provavelmente gerados a partir do intemperismo (alteração) das rochas graníticas encontradas próximas dali, nas porções Oeste e Noroeste de Viamão e em Porto Alegre.
“Existem espaços entre esses grãos, onde a água subterrânea fica armazenada e flui, formando o aquífero granular (formado por grãos de areia). A feição alongada e arenosa que forma a Coxilha das Lombas é mais alta que as áreas adjacentes e serve como área de recarga do aquífero, sendo que a água da chuva infiltra e circula relativamente rápido entre os grãos, sendo esse um dos motivos pelos quais a água subterrânea do aquífero apresenta boa qualidade. Mas, isso também deixa o aquífero, de certa forma, vulnerável à contaminação oriunda da superfície, que pode chegar ao aquífero a partir de vazamentos em postos de combustíveis, chorume de lixões, e de outras possíveis fontes”, alerta.
Sobre os poços da Ambev, a pesquisadora diz que são tubulares com aproximadamente 100 metros de profundidade e captam água do aquífero Coxilha das Lombas. Foram perfurados pela CORSAN da metade para o final dos anos 90 na região de Águas Claras, e que evidenciaram o potencial que o aquífero Coxilha das Lombas tem, tanto em termos de qualidade da água, quanto em quantidade.
“Em geral, os poços que se encontram em Águas Claras e retiram boas vazões, mostrando uma rápida recuperação do nível do aquífero quando cessa o bombeamento”, ressalta Luísa.
Também ocorrem em Viamão aquíferos formados nas rochas graníticas, chamados de aquíferos fraturados. É o Sistema Aquífero Embasamento Cristalino. Estão localizados nas porções oeste e noroeste de Viamão. Neles, a água se encontra nas fraturas que existem nas rochas. Tiveram sua origem há cerca de 800 milhões de anos, quando dois antigos continentes colidiram: o Rio de La Plata (sul-americano) e o Kalahari (africano). Com a colisão, formou-se uma antiga cadeia montanhosa, conhecida por Cinturão Dom Feliciano.
A partir desse antigo cinturão se formaram rochas graníticas que somente são visíveis hoje em Viamão porque toda a região sofreu intensa erosão, expondo à superfície as rochas que estavam originalmente em profundidade.
“Em Viamão existem muitos poços que captam água do aquífero fraturado, mas, comparado a ele, Coxilha das Lombas se destaca, sendo considerado o melhor aquífero da Região Metropolitana de Porto Alegre e um dos poucos da região onde podem ser projetados empreendimentos que dependem de água subterrânea como fonte de abastecimento”, completa a geóloga.
* Colaboraram nesta série de reportagens o repórter fotográfico Ramiro Sanchez e os jornalistas Elmar Bones e José Barriunuevo.