O general Mourão Filho botou o golpe na rua às cinco hora da manhã do dia 31 de março de 1964. Ele ainda vestia seu roupão vermelho (diz no seu Diário), quando anunciou por telefone que ia marchar de Juiz de Fora com suas tropas para destituir o presidente da República no Rio de Janeiro.
Como os jornais diários, que começaram a circular à hora em que Mourão disparava seus telefonemas, não traziam a notícia, o dia foi de muitos de boatos e escassas informações.
Em Porto Alegre, a primeira informação confiável de que havia um golpe em andamento chegou as 16h30, através do rádio ao comando do III Exército, que reservadamente colocou suas unidades em prontidão.(*Hélio Silva, “1964″),
A notícia ficou restrita, no entanto. “Falava-se tanto em golpe, que ninguém acreditava nele”.
A tal ponto, que a festa de aniversário do prefeito da cidade, Sereno Chaise, iniciou por volta das 19 horas e só foi interrompida por volta das dez, quando alguém cochichou ao ouvido do aniversariante a informação recebida do Rio. Ele tomou o microfone, deu o aviso e convocou a todos para se deslocarem até a prefeitura no centro da cidade e acompanhar os acontecimentos (Sereno Chaise, depoimento).
Um comício foi improvisado, mas como pouco se sabia do que estava acontecendo, rapidamente ele se esvaziou. Um grupo que se dirigiu à sede do governo estadual encontrou a praça vazia, o Palácio Piratini fechado, luzes apagadas, sem sinais de anormalidade. Foram todos para casa. Afinal, boato de que haveria um golpe não era novidade.
Àquela altura o major Confúcio Pamplona, à paisana, entregava ao general Adalberto Pereira dos Santos um papel pardo escrito de próprio punho pelo general Castelo Branco com os objetivos da “revolução”:
a) restaurar a legalidade,
b)restabelecer a Federação,
c) eliminar o plano comunista da posse do poder, em desenvolvimento; defender as instituições militares, estabelecer a ordem para o advento das reformas legais.
Comandante da 6ª. Divisão de Infantaria, a principal força do III Exército no Sul, Adalberto era o chefe militar da conspiração no Estado. Pressionava inclusive o comandante geral, general Benjamin Galhardo, para que não reconhecesse o novo comandante que Jango havia nomeado naquela tarde para o III Exército, o general Ladário Telles. Telles deveria chegar a Porto Alegre na noite de 31 de março. Em vez de passar o cargo, Galhardo deveria prendê-lo.
Perto da meia noite, quando já estava para chegar o avião, Galhardo voltou atrás: “Eu não tomo uma decisão”, foi a frase que Krieger ouviu. O general Adalberto Pereira dos Santos passou a informação a Poti Medeiros, Secretário de Segurança e este informou o governador Meneghetti, que decidiu deixar a capital. “Poucas são as possibilidades de resistência em Porto Alegre, cujo bravo povo está ameaçado pelas forças da violência e da opressão”, dizia o manifesto que Meneghetti deixou ao sair, para se por a salvo em Passo Fundo, a 300 quilômetros da capital.
O general Telles chegou a Porto Alegre a 1h20 da manhã, já no dia primeiro de abril. Enfrentou resistências, mas por fim conseguiu assumir o comando, na madrugada.
Uma de suas primeiras providências seria transferir o general Adalberto, de volta ao Rio. O general alegou que não poderia viajar imediatamente por causa de uma irmã, doente. No dia seguinte, saiu de Porto Alegre e foi para Cruz Alta, depois para Santa Maria, onde as guarnições eram favoráveis ao golpe.
Na manhã de 1 de abril, o governador Ildo Meneghetti deixa o Palácio Piratini. Saída discreta, sem escolta. Antes de partir deixou folhas em branco assinadas.
Uma delas seria usada para responder ao comandante do III Exército, que no mesmo dia requisitou a Brigada Militar, a força estadual, que fora decisiva na resistência ao golpe em 1961. O secretário do Interior, Mario Mondino, datilografou na folha assinada por Meneghetti uma resposta evasiva e não cumpriu a ordem.
Enquanto isso, Meneghetti chegava ao 2º. Batalhão de Caçadores da Brigada Militar em Passo Fundo. Requisitou a rádio local e divulgou notas incitando o povo a apoiar a revolução. À noite, num comício improvisado, Meneghetti discursou: “As forças revolucionárias colocaram um ponto final no comunismo que estava tomando conta do Brasil”.
Na manhã do dia 2 de abril, o presidente do Senado, Auro Moura Andrade, declara a aliados: “A revolução está vitoriosa, mas temo que pelo mito da legalidade haja derramamento de sangue. Se me derem cobertura declararei vaga a Presidência da República”.
À tarde numa sessão de três minutos, declarou que Jango havia abandonado o país (na verdade, estava voando para Porto Alegre). À noite o deputado Rainieri Mazzilli, presidente do Congresso foi empossado como presidente. Para Krieger,“a solução almejada pela Nação fora obtida com a quebra momentânea da legalidade, imediatamente restabelecida”.
No Rio, uma junta controlava a situação militar: Costa e Silva, Augusto Redemaker e Correia de Melo – um general, um vice-almirante e um brigadeiro. Em Brasília, um presidente interino, Rainieri Mazzilli, fora empossado às pressas pelo Congresso, às 3h50 da madrugada.
O golpe estava consumado.