Como criar um livro sobre uma cidade

Nesta quinta-feira será o segundo encontro do Ciclo de Rodas de Conversas: Memórias, no Memorial do Rio Grande do Sul.
O mote do debate é “Como criar um livro sobre uma cidade: a experiência do livro Viamão 300 Anos”. O livro foi lançado em julho, na Igreja Matriz de Viamão, e em agosto teve sessão de autógrafos em Porto Alegre, no próprio Memorial.

Os debatedores são o autor e editor Elmar Bones, o gestor cultural Vítor Ortiz e o jornalista José Barrionuevo.

Bones trouxe para  este livro e experiência como editor de duas obras fundadoras de um método de trabalho que consiste em contar a História em linguagem jornalística: História Ilustrada de Porto Alegre (1997) e História Ilustrada do Rio Grande do Sul (1998, reeditada em 2015), títulos produzidos por Jornal JÁ Editora.
O evento será das 18h30 às 19h30, no auditório do primeiro andar do Memorial. Aberto ao público.
Rua Sete de Setembro, 1020 – Praça da Alfândega – Centro Histórico – Porto Alegre.

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Polícia Federal busca financiadores do atentado no aeroporto de Brasília

O assunto saiu do noticiário,  mas a Polícia Federal ao que tudo indica não parou de investigar.

Na manhã desta quinta-feira, 06, a PF anunciou a Operação Embarque Negado, “para chegar aos financiadores do atentado a bomba nas proximidades do Aeroporto Internacional Juscelino Kubitschek, em Brasília, em dezembro de 2022”.

Seis mandados de busca e apreensão foram cumpridos, sendo um em Marabá (PA), um em Água Boa (MT) e quatro no Distrito Federal.

Em nota, a PF explicou que “os envolvidos estão sendo investigados pelos crimes de atentado contra a segurança de transporte marítimo, fluvial ou aéreo, atentado contra a segurança de serviço de utilidade pública  e associação criminosa”.

As investigações se referem também a outros dois episódios: o de 2 e 8 de dezembro de 2022, quando várias pessoas invadiram a área de acesso restrito e locais próximos ao aeroporto da capital, causando uma série de transtornos a segurança aérea e ao serviço do terminal. 

O atentado foi frustrado no dia 24 de dezembro, quando o motorista de um caminhão tanque, numa inspeção de rotina, encontrou uma bomba entre os eixos do veículo que estava carregado de combustível para o aeroporto, e chamou a polícia.

A polícia, em princípio, descartou a participação dele, mas prendeu George Washington de Oliveira Souza, por suspeita de envolvimento no caso.  Ele mora no Pará mas estava em Brasilia para participar das manifestações de apoio ao presidente Jair Bolsonaro, em frente ao quartel general do Exército, na capital.

O homem foi localizado e preso em um apartamento na região do Sudoeste e confessou que tinha intenção de explodir o artefato no aeroporto. Com ele, foi apreendido um arsenal com pelo menos duas espingardas, um fuzil, dois revólveres, três pistolas, centenas de munições e uniformes camuflados. No apartamento, foram encontradas outras cinco emulsões explosivas. À época ele disse que “queria dar inicio ao caos”.

George Washington foi condenado pelo crime a 9 anos e 4 anos meses de prisão e está foragido. Também foi condenado no caso Alan Diego dos Santos Rodrigues, que está preso.. Alan confessou à Polícia Civil que recebeu a bomba colocada no caminhão-tanque no acampamento em frente ao Quartel-General do Exército. Ele também afirmou ter colocado o explosivo no caminhão pessoalmente, e disse que na ocasião estava acompanhado por Wellington Macedo de Souza.

(Com Agência Brasil e G1)

Jornalista que escrevia “cartas ácidas” para Lula está otimista com terceiro mandato

Durante três anos e meio do primeiro governo Lula, o jornalista Bernardo Kuscinski, com uma pequena equipe, produziu uma síntese analítica do noticiário diário dos principais veículos para o presidente.

Em tempos de pré-internet, a operação incluía um funcionário que buscava os jornais impressos do Rio e São Paulo num trecho do Eixão, em Brasília, às cinco da madrugada.

Às oito da manhã a resenha impressa em envelope lacrado deveria estar na mesa do presidente.

O próprio Lula apelidou de “cartas ácidas”. Dizia que se passasse uma toalha no suor de Kucinski e espremesse dava para fazer vinagre.

As cartas faziam uma leitura crítica da mídia, mas também eram implacáveis com os erros do governo. Lula reclamava mas lia sempre.

“Eu fiquei viciado em escrever e ele em ler” diz Kucinski no livro “Cartas a Lula” que reúne uma seleção dos mais de mil textos produzidos.

Aos 80 anos, Bernardo Kuscinski, que no meio jornalístico dispensa apresentações, dedica-se à literatura com vários livros publicados, com prêmios e indicações a prêmios.  Mas não perdeu o vício: embora não se disponha mais àquele tipo de escrita das cartas, segue acompanhando criticamente os movimentos do governo e o tratamento que eles recebem da mídia.

Até agora ele está otimista com o terceiro mandato de Lula: “A principal mudança em relação ao primeiro governo é o próprio Lula. Ele mudou, ele manda. Está afirmativo, não hesita em dizer que o teto de gastos é uma estupidez e, principalmente, ele tem agora uma visão muito mais clara do seu papel histórico”,

As crises no primeiro governo, segundo Kucinski, começaram antes da posse “com a campanha de terrorismo financeiro que levou Lula a fazer um acordão com os bancos para ter condições de governabilidade”.

“Acordo foi avalizado por Antonio Palocci e Henrique Meirelles e  esse pacto não escrito amarraria suas mãos e travaria o governo durante os dois primeiros anos de mandato, provocando forte tensão interna e deprimindo o presidente”.

Na avaliação do jornalista, “todo o primeiro governo Lula foi atravessado por contradições que o paralisavam”.

De um lado o ministro da Fazenda, Antônio  Palocci, e o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, comprometidos com o setor financeiro, avessos a investimentos sociais.

De outro, José Dirceu, todo poderoso chefe da Casa Civil, e Luiz Gushiken, também poderoso ministro das Comunicações, que não se entendiam. Além de tudo isso, havia “muita ingenuidade e amadorismo”. O próprio presidente tinha visíveis limitações. No livro Kusinski conta que um assessor próximo de Lula lhe pediu para que fosse mais didático nas notícias sobre macroeconomia.

O principal compromisso de Lula era dobrar o salário mínimo em quatro anos, Palocci se opunha tenazmente. “Palocci queria manter o salário mínimo arrochado. Numa reunião dramática, Palocci ameaçou ir à televisão dizer que não conseguiria cumprir o compromisso de superávit primário”.

“Palocci compartilhava espertamente as caminhadas matinais de Lula e as aproveitava para tentar fazer a cabeça do presidente.”

Só a partir da queda de Palocci em março de 2006, que Lula pode começar a cumprir sua promessa de campanha. Quando assumiu em 2003, o mínimo era equivalente a 86 dólares, no fim do segundo mandato já era 256 dólares. “Ao contrário das previsões catastróficas o aumento do salário mínimo não levou a uma explosão de preços”.

A mídia – Globo, Folha de São Paulo, Estadão, Veja, reverberados pelo país inteiro – foi a “condutora ideológica da oposição ao governo”, segundo Kucinski.

No prefácio de seu livro, ele lembra os ataques aos programas sociais, a ponto de reportagens negarem o problema da fome no Brasil, para depreciar o Fome Zero, o primeiro programa lançado pelo governo.

Nem por isso deixa de apontar os erros do governo, que a seu ver não foram poucos na área da comunicação.

“Desde o primeiro dia não foi boa a relação do governo com a mídia. Faltou ao governo uma política orgânica e moderna de comunicação pública”.

Lembra que “o presidente Lula só deu a sua primeira entrevista coletiva dois anos depois. As anteriores em agosto de 2003 e fevereiro de 2004, foram dadas a grupos limitados de jornalistas”.

A “frustração pelo não encaminhamento de propostas na esfera da comunicação” foi um dos motivos que o levaram a deixar o governo  pouco antes do final do primeiro mandato. “Propostas de mudança de postura da Radiobras. Propostas e pré-projetos à Secom: por uma política de apoio à mídia alternativa, por um programa vale-jornal (parecido com o vale-cultura do governo Dilma), pela criação de um jornal do executivo, como o da Câmara, pela instituição de coletivas regulares, pela criação de cadernos de referência sobre políticas públicas”. Nada disso foi adiante.

O outro motivo foi “o desassossego com a questão dos crimes da ditadura: “Sentia crescente desconforto por estar no coração de um aparelho de Estado que a rigor não abjurara seus crimes, cometidos pouco tempo antes”.

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Bernardo Kucinski é formado em Física pela Universidade São Paulo (USP), foi militante estudantil, preso e exilado. Tornou-se jornalista, passando pelos veículos mais importantes do Brasil e do mundo, como os ingleses BBC The Guardian. Foi fundador de jornais alternativos de resistência ao regime militar, como Movimento. Deu aulas de jornalismo na Escola de Comunicação e Artes da USP, publicou uma série de obras acadêmicas, foi assessor especial da Secretaria de Comunicação Social (Secom) da Presidência da República durante o primeiro mandato de Lula, quando produzia boletins diários sobre a imprensa.

Atentado terrorista em Brasilia: zelo do motorista impediu a bomba

O atentado terrorista frustrado em Brasilia não está merecendo a devida cobertura jornalística, até nisso comparável ao Riocentro.

As grandes corporações, com suas redes e suas afiliadas, ainda estão tratando burocraticamente o caso.

Setenta e duas horas depois da prisão do homem que confessou ter armado a bomba, não apresentaram um perfil consistente dele e suas circunstâncias.

O que circula sobre George Washington de Oliveira, o homem preso por armar a bomba, é revelador de toda a gravidade do episódio,  mas incompleto, e foi levantado por jornalistas independentes e sites alternativos.

Além disso, há toda uma trama a desvendar e que requer o olho atento da opinião pública, representada pela imprensa, principalmente a que tem meios de apurar os fatos.

A entrevista coletiva, na manhã desta terça-feira,  do ministro da Justiça nomeado e do governador do Distrito Federal rendeu notícia secundária nos jornalões, que se auto proclamam panteões do jornalismo profissional.

Flávio Dino e Ibaneis Rocha disseram que o plano de explodir o aeroporto de Brasilia foi tramado por “apoiadores de Jair Bolsonaro  acampados em frente ao quartel-general do Exército em Brasília, que executaram os atos terroristas no dia 12 de dezembro”.

Mais: os conspiradores procuraram um sniper – atirador de elite – para pedir aulas antes da posse de Lula (PT).

Outro personagem que passou batido:  o dono do caminhão onde foi alojada a bomba, um caminhão tanque lotado de querosene para avião.

Segundo declarou a polícia, o motorista mineiro Jeferson Henrique Silveira, de 33 anos, achou a bomba numa vistoria de rotina, antes de partir com o caminhão rumo ao aeroporto. Era um pacote de papelão, alojado entre um dos eixos.

A Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) prendeu o suspeito de armar a bomba próximo ao Aeroporto de Brasília no mesmo dia.

Se essa versão é correta, não foi a diligência policial como diz  o grosso do noticiário, que evitou o atentado terrorista que pretendia mergulhar o Brasil no caos. Foi o zelo deste motorista.  Até agora, zero hora de 28/12/2022, não há uma foto dele publicada.

Agência Brasil divulga o desmonte dos direitos humanos no governo Bolsonaro

Agência de notícias do governo federal, a Agência Brasil, publicou nesta sexta-feira extensa matéria sobre o relatório da Comissão de Transição, que levantou a situação na área de direitos humanos.

Diz o texto, ilustrado por uma foto do advogado Silvio Almeira, já nomeado por Lula para o Ministério:

“(…) o relatório final da equipe de transição para o terceiro governo do presidente eleito Luís Inácio Lula da Silva apontou desmonte de diversas políticas e pesados cortes orçamentários nos programas da área”.

“Segundo a análise dos grupos setoriais de trabalho, as estruturas de participação social tiveram o papel esvaziado ou foram extintas durante o governo do presidente Jair Bolsonaro”.

E segue:

A desarticulação atingiu, de acordo com o gabinete de transição, 12 colegiados que passaram por mudanças que precarizaram ou dificultaram a participação efetiva da sociedade civil.

Foram extintos ainda a Comissão Intersetorial de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional e a Comissão Nacional para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.

Os grupos de trabalho destacaram, no relatório apresentado nesta quinta-feira (22), que a recriação desses mecanismos, assim como a retomada das atividades dos órgãos que tiveram as atividades precarizadas ou desconfiguradas, é fundamental para a rearticulação das políticas na área dos direitos humanos.

Cortes orçamentários
A análise chama atenção para a necessidade de retomar os investimentos na proteção das populações vulnerabilizadas. Em 2015, as políticas em favor das mulheres, dos direitos humanos e de combate ao racismo receberam, segundo o gabinete de transição, o equivalente a R$ 1,1 bilhão em valores atualizados. Em 2022, o empenho orçamentário para essas áreas ficou em R$ 238 milhões, de acordo com o verificado pelo grupo.

Além da redução dos recursos disponíveis, os dados mostram que uma parte do dinheiro não foi sequer aplicada. “O cenário orçamentário-financeiro da pasta indica a inviabilidade da política de direitos humanos, caso não haja recomposição orçamentária a partir de 2023”, enfatiza o relatório do gabinete.

Entre as políticas prejudicadas pela falta de dinheiro está o combate ao trabalho escravo. Segundo o diagnóstico, devido aos cortes, os fiscais do trabalho passaram a ter dificuldades para realizar suas atividades, impossibilitando inclusive a produção de dados sobre os casos de trabalho análogo à escravidão nas partes mais remotas do país.

No caso das políticas para criança e adolescente, o grupo de trabalho aponta para uma redução de 96,7% no volume de recursos investido. Segundo o relatório do grupo de trabalho da área, em 2009, foram gastos R$ 498,2 milhões para promoção e defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes, em valores atualizados pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Em 2018, os recursos caíram para R$ 140 milhões e, em 2022, ficaram em R$ 35 milhões.

Terras indígenas e quilombolas
O relatório do gabinete destaca que houve completa paralisação dos processos para demarcação de terras indígenas no país. Esses territórios, aponta o documento, também têm sofrido com o aumento de invasões por garimpeiros, madeireiros, pecuaristas, pescadores e caçadores ilegais.

Na Terra Indígena Yanomami, que fica nos estados de Roraima e Amazonas, onde vivem 28,1 mil indígenas em 371 comunidades, foi registrado, em 2021, um aumento de 46% nas atividades de garimpo ilegal.

Além disso, segundo a análise, a Fundação Nacional do Índio (Funai) sofreu desorganização das atividades administrativas e “drástica redução orçamentária”. De acordo com o gabinete, foram nomeadas para cargos na fundação, pessoas sem experiência com assuntos indígenas ou contrários aos interesses dos povos tradicionais.

Fundação Palmares
A regulação fundiária dos territórios quilombolas também ficou, segundo o relatório, paralisada nos últimos anos. O setor sofreu com a diminuição de 93% no orçamento destinado às políticas de promoção da igualdade racial, na comparação com os recursos disponibilizados em 2015.

A Fundação Cultural Palmares também sofreu, segundo o relatório, um processo de tentativa de “destruição”, com manobras que buscavam que o órgão rompesse com a missão institucional de promover os valores culturais e sociais afrobrasileiros.

É orientação do gabinete de transição que sejam revogadas a resolução do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) que paralisou a demarcação de territórios quilombolas e da portaria da Fundação Palmares que dificultou os procedimentos para reconhecer essas comunidades.

Risco às mulheres
A desvirtuação das políticas de direitos humanos começa, segundo o relatório, no próprio Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos que “pautou a sua atuação na negligência de populações vulnerabilizadas, na negação da existência de graves violações a direitos, e no desmonte de políticas públicas arduamente conquistadas”.

Entre os programas que perderam a funcionalidade, o gabinete de transição cita os serviços telefônicos Disque 100 e Disque 180, voltados para receber denúncias de violações de direitos humanos e de violência contra a mulher, respectivamente. Ambos foram, de acordo com o documento, desvirtuados e tiveram o funcionamento precarizado.

Em relação as políticas que afetaram negativamente a vida da população feminina, o relatório aponta a flexibilização do controle de armas de fogo. Foram registradas mais de 400 mil armas durante o último governo, sendo que 96% estão em nome de homens.

“Quando consideramos que mais da metade dos casos de violência contra as mulheres são cometidos por companheiros, ex-companheiros, pais ou padrastos e dentro de casa, podemos dizer que isso eleva tanto o grau de escala de opressão, silenciamento e repressão sobre as mulheres”, enfatiza o documento.

O gabinete de transição recomendou a revogação de oito decretos presidenciais que facilitaram o acesso às armas de fogo e a revisão de uma portaria interministerial que também trata sobre o tema.

Mudanças climáticas: Prêmio Nobel faz palestra em Porto Alegre

O economista britânico Benny Dembitzer, Prêmio Nobel da Paz em 1985, vem ao Brasil para uma série de palestras nas instituições da Ânima Educação – uma das maiores organizações privadas de ensino superior do país.

Especialista em economia de países em desenvolvimento, o professor do University College London (UCL) estará na UniRitter no dia 29 de agosto, no Auditório Master do campus Zona Sul, às 19h, para discutir os reflexos da globalização, efeitos do capitalismo, vulnerabilidade social e as ameaças que colocam em risco o futuro da humanidade.

Com o apoio do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE), a palestra ‘Recuperando o nosso planeta: cenários futuros e mudanças globais – economia, sociedade e meio ambiente’ será apresentada também nas instituições UniSul, em Florianópolis (30/8); UniSociesc, em Joinville (31/8); UniCuritiba, na capital paranaense (1/9); e Universidade São Judas, em São Paulo (5/9).

Dembitzer era diretor europeu da Médicos Internacionais para a Prevenção da Guerra Nuclear (IPPNW) quando ganhou, junto com a equipe, o Prêmio Nobel da Paz em 1985. Dirigiu o Fundo de Pesquisa e Investimento para o Desenvolvimento da África na década de 1970; foi conselheiro sobre o desenvolvimento industrial da Conferência de Coordenação de Desenvolvimento da África Austral (SADCC) e, ao longo dos anos, trabalhou em 35 países na África e na Ásia.

Em sua agenda pelas instituições da Ânima, o economista deve promover importantes reflexões sobre os rumos da humanidade e a saturação dos sistemas econômicos, assim como aborda em seu mais recente livro ‘The Famine next door: Africa is burning and the West is watching’ (A Fome ao lado: a África está queimando e o Ocidente está assistindo). Na obra, Dembitzer destaca o quanto as sociedades são centralizadas. “Nossas sociedades são altamente urbanas, metropolitanas e centralizadas. Não entendemos mais as sociedades que estão em diferentes níveis de desenvolvimento nem os países pobres que não têm estruturas para enfrentar seus desafios. Precisamos ajudar por meio de parcerias reais em todos os níveis.”

Graves ameaças 

“Bem-vindo ao mundo real, o mundo em que todos vivemos, o mundo que minha geração destruiu”, diz o vencedor do Prêmio Nobel. “Eu pensei que teria algo para passar para meu neto, mas ele não terá nada para contemplar, nem rios para nadar, nem florestas para desfrutar, nem elefantes para admirar na natureza.”

Os motivos, aponta o palestrante, estão na confluência de graves ameaças: “Inflação de alimentos. Inflação energética. Inflação do custo de vida. Colapso do ambiente físico. As florestas estão pegando fogo, a água está desaparecendo de nossos rios e lagos. Temos um mecanismo de crescimento descontrolado que não podemos parar.”

Globalização

Aos convidados e estudantes da UniRitter, o palestrante falará sobre a globalização e o que chama de capitalismo sem controle.

“Vimos a globalização como o início de uma nova era, um conjunto de princípios que se espalhariam e melhorariam o mundo, mas não podemos romantizá-la. Vivemos em um mundo onde temos a ilusão de ter escolhas, mas não temos. As escolhas estão sendo feitas por aqueles que têm poder, seja o da idade, da força pessoal, das armas, da força bruta e, às vezes, do capital.”

Segundo Dembitzer, a globalização falhou. “Tirou empregos de indivíduos comuns em nossas sociedades. Criou cadeias de abastecimento cada vez mais frágeis nas indústrias e na agricultura. Falhou, inclusive, em fornecer proteção contra a destruição ambiental. Criou escassez de alimentos. Impediu que os países pobres tivessem acesso a vacinas porque as multinacionais controlaram os direitos de propriedade internacional.”

Com sistemas mundiais altamente complexos, avalia o economista, fica difícil manter o controle. “Agora que a globalização atingiu o pico, só podemos esperar que gerenciemos melhor seu declínio do que gerenciamos sua ascensão.”

Soluções individualizadas

Ainda que as nações vivam um grande número de problemas comuns, a ideia de que existem soluções globais é equivocada na análise do especialista. “Cada problema deve ser identificado e tratado separadamente. Se houver um incêndio na Amazônia, você não tem como pedir ajuda aos bombeiros da França. Não devemos travar batalhas globais, mas podemos lutar e vencer batalhas locais.”

Além do localismo cuidadoso que proteja o interesse dos indivíduos, Dembitzer vê o papel das universidades como determinante na recuperação do planeta e das dimensões humanas. “A comunidade acadêmica precisa liderar os elos e construir as pontes, porque só a cooperação poderá garantir a sobrevivência humana”, finaliza.

(Com informações da Assessoria de Imprensa)

Eleições 2022: “O golpe está acontecendo, no Congresso”

A ameaça do golpe militar é “manobra dispersiva”.

O verdadeiro golpe, o golpe da continuidade, já está sendo dado pelo Congresso, sob domínio do Centrão.

A conclusão é do jornalista Bernardp Kucinski,  que foi assessor direto de Lula, no primeiro governo, para questões de mídia.

No primeiro governo Lula, ele e sua equipe produziam uma síntese crítica, diária, do noticiário, que o presidente recebia antes de começar o expediente no Palácio do Planalto.

Jornalista, professor aposentado e escritor, Kucinski mantém-se atento e crítico.

“Há um mecanismo dentro do Congresso preparando a continuidade, para que nada mude, mesmo que mude o governo”, diz ele.

É, segundo ele, quase um organismo vivo, que se alimenta de manipular os recursos em benefício próprio, para garantir a eleição desses grupos que controlam o poder. “Lira é o representante disso”.

O orçamento secreto, o “pacote de bondades”, é a parte ostensiva dessa estratégia. São mecanismos para reeleição do poder continuista, segundo a observação de Kucinski.

Com esse poder garantindo a intocabilidade das reformas neoliberais implementadas nos últimos anos, o novo governo, seja quem for, estará imobilizado e dependente de acordos que vão frustrar as mudanças necessárias.

 

 

 

 

 

 

JBS se torna maior empresa de carnes na Austrália. Imprensa lembra casos de suborno

 Uma investigação jornalística foi publicada neste domingo no Four Corners, da Austrália,  rastreando a trajetória da JBS, a gigante brasileira que teve origem num açougue do interior e atualmente é a maior empresa de carnes do mundo.

 A reportagem assinada por três jornalistas (veja abaixo) lembra as denúncias de corrupção em que a empresa esteve envolvida, a partir de 2007, e atribuiu sua expansão na Austrália a recursos obtidos através de subornos, no Brasil.

 No ano passado, numa expansão inédita para o mercado da piscicultura, a JBS comprou o segundo maior produtor de salmão de viveiro da Austrália, Huon Aquaculture, por US$ 425 milhões.    

 

Leia Mais:

Dos subornos ao seu churrasco: como a maior empresa de carnes da Austrália foi construída com base na corrupção

Grace Tobin , Lesley Robinson e Patrick Begley

Talvez você não conheça o nome JBS.

Mas se você comprar presunto Primo, salmão Huon, hambúrgueres do McDonald’s ou carne de Coles, Woolworths ou Aldi, provavelmente está comendo produtos da JBS.

É a maior empresa de carnes do mundo, a maior da Austrália, e está devorando cada vez mais nossa indústria alimentícia.

A Four Corners pode revelar que por trás da expansão inicial da gigante de alimentos na Austrália havia subornos pagos no Brasil e dois irmãos bilionários dispostos a infringir a lei para conseguir o que querem.

Aqui está o que você precisa saber sobre a empresa por trás do seu próximo churrasco.

Expansão rápida

O império da família começou em 1953 como um pequeno açougue regional do Brasil, comandado pelo empresário José Batista Sobrinho.

Quando seus filhos Joesley e Wesley assumiram as rédeas, o negócio se expandiu no Brasil, em toda a América do Sul e na América do Norte.

Uma aquisição de US$ 1,4 bilhão (US$ 1,9 bilhão) da processadora de carne bovina norte-americana Swift fez da JBS um importante player internacional em 2007.

Esse mesmo acordo deu à JBS o controle da Australian Meat Holdings, maior processadora de carne bovina do país, que era de propriedade da Swift.

Os planos da JBS para a Austrália não pararam por aí.

No ano seguinte, a JBS pagou US$ 150 milhões pelo Tasman Group, que possuía matadouros na Tasmânia e Victoria, além de um confinamento em NSW.

De repente, a JBS tinha sites na costa leste da Austrália – levantando as sobrancelhas de alguns produtores e pecuaristas locais.

De onde vinha todo o dinheiro?

A JBS tinha o apoio financeiro do governo brasileiro – algo que Wesley Batista insistia na época era uma “estrutura financeira normal”.

De fato, a Four Corners confirmou que suas duas primeiras aquisições na Austrália foram alimentadas por corrupção e suborno no Brasil.

O extremamente bem relacionado Joesley Batista havia orquestrado a onda de aquisições globais da empresa, comprando concorrentes enquanto expandia sua cadeia de suprimentos.

Mas ele detonou um escândalo de corrupção no Brasil em 2017, testemunhando contra conexões de alto nível que ele havia subornado.

Joesley, Wesley e alguns de seus executivos mais seniores delinearam um vasto esquema que envolvia pagamentos a mais de 1.800 políticos.

Em troca da imunidade dos irmãos Batista, a controladora da JBS concordou em pagar uma multa de US$ 3,2 bilhões.

Joesley confessou que pagou propina ao ministro da Fazenda do Brasil, no entendimento de que o ministro persuadiria um banco estatal a financiar empreendimentos da JBS.

Esse financiamento ajudou a pagar a aquisição envolvendo a Australian Meat Holdings.

No ano seguinte, outra rodada de financiamento sustentada por subornos foi usada na aquisição do Tasman Group.

Um promotor perguntou a Joesley se a JBS teria conseguido financiamento sem as propinas ao ministro da Fazenda.

“Não, não”, ele respondeu. “Não haveria acordos.”

De escândalo em escândalo

Desde o escândalo de corrupção, as dores de cabeça da JBS só continuaram.

Wesley e Joesley passaram um tempo na prisão em 2018, acusados ​​de insider trading depois que venderam ações e especularam sobre a moeda antes de seu acordo judicial.

Nos Estados Unidos, a controladora da JBS pagou US$ 256 milhões para resolver um caso de suborno estrangeiro, enquanto a empresa também pagou centenas de milhões de dólares a mais em multas e acordos sobre esquemas de fixação de preços.

A JBS prometeu ajudar a salvar a floresta amazônica, mas tem enfrentado repetidas acusações de adquirir gado de terras desmatadas ilegalmente no Brasil.

Foi multado em US$ 8 milhões por desmatamento em 2017.

Embora tenha se comprometido a proteger a Amazônia, a JBS foi acusada de adquirir gado de terras desmatadas ilegalmente.

Apesar das promessas de reprimir o problema, investigações da Bloomberg e do Repórter Brasil alegam que o problema continua.

Várias redes de supermercados na Grã-Bretanha abandonaram produtos que usam carne bovina da JBS no Brasil.

A Coles estoca carne enlatada importada da JBS no Brasil em suas prateleiras na Austrália, mas se recusou a comentar se tem alguma preocupação com o desmatamento ilegal em sua cadeia de suprimentos.

Em nota, a JBS Brasil disse que foi uma das primeiras empresas a investir em políticas e tecnologia para combater e eliminar o desmatamento na Amazônia e que “continua firmemente comprometida com essa causa”.

A JBS também ganhou as manchetes durante sua longa batalha com o Australian Taxation Office (ATO) depois que uma auditoria de 2019 identificou “vários riscos fiscais” dentro do negócio.

Mas a empresa resistiu a entregar ao ATO milhares de páginas de correspondência com seus consultores fiscais, PwC, alegando que os documentos estão protegidos por privilégio legal.

JBS recebe autorização para escalar na Austrália

Nada disso restringiu as ambições da JBS na Austrália, onde agora está entrando em um setor totalmente novo: a piscicultura.

No ano passado, a empresa comprou o segundo maior produtor de salmão de viveiro da Austrália, Huon Aquaculture, por US$ 425 milhões.

A oferta provocou forte reação de ambientalistas como o ex-líder dos Verdes Bob Brown e o autor Richard Flanagan.

O bilionário e acionista da Huon, Andrew Forrest, até pagou por uma série de anúncios em jornais nacionais argumentando contra uma aquisição.

Essas vozes foram contestadas pelo então primeiro-ministro da Tasmânia, Peter Gutwein, e pelo ministro assistente federal de pesca, Jono Duniam, que saudaram publicamente os planos de salmão da JBS.

A compra da Huon e – em uma tentativa de expandir ainda mais a indústria de suínos – o principal processador de carne suína Rivalea em 2021, foram os principais testes para a JBS.

Não havia comprado uma empresa australiana desde o escândalo de corrupção.

Ambos os negócios precisavam ser aprovados pelo tesoureiro Josh Frydenberg e avaliados por seus assessores no Foreign Investment Review Board (FIRB), que considera o interesse nacional e o caráter dos investidores .

JBS na Austrália

  • JBS emprega 14.000 pessoas em mais de 50 sites
  • É expandido de carne bovina e cordeiro para carne de porco e agora salmão
  • As marcas de propriedade da JBS incluem Primo, Huon Aquaculture, King Island Beef e Aussie Beef
  • Seus produtos são estocados em grandes supermercados como Woolworths, Aldi e Coles

O CEO da JBS Australia, Brent Eastwood, disse à rádio ABC em setembro que a empresa tinha um bom relacionamento com a FIRB.

Ao contrário do ex-tesoureiro Joe Hockey, que ficou feliz em elogiar a aquisição da Primo pela JBS em 2015, Frydenberg tem sido mais discreto.

Ele não fez nenhuma declaração pública ao aprovar os últimos acordos e se recusou a responder a perguntas do Four Corners.

A JBS Austrália recusou uma entrevista e não respondeu a perguntas escritas.

Em um comunicado, ele se descreveu como um “orgulhoso cidadão corporativo australiano com uma marca e reputação fortes”.

Embora os irmãos Batista – que a Forbes estima valer cerca de US$ 5 bilhões cada – não fazem mais parte do conselho da JBS ou ocupam cargos de gerência executiva, eles mantêm grandes participações na empresa.

A Batista continuará supervisionando a expansão da empresa na Austrália – o filho de Wesley, Wesley Junior, é agora o presidente global da Oceania.

Bruno Brandão, da Transparência Internacional Brasil, alerta que mudar a conduta de uma empresa como a JBS é uma tarefa desafiadora.

“[Ela] precisa de muita pressão das autoridades, dos consumidores, dos investidores para realmente garantir que esse tipo de empresa, que passa pela corrupção sistêmica, realmente transforme suas práticas.”

 

 

31 de março de 1964: general conta em seu diário como deflagrou o golpe, pelo telefone

A uma e meia da madrugada de 31 de março de 1964, general Olympio Mourão Filho desiste de tentar dormir e retoma as anotações em seu diário*.

Repassa as últimas 48 horas, vividas sob grande tensão.

Há quase uma semana ele se considera pronto para o golpe, mas desconfia que o estão traindo.

Esperava um manifesto do governador de Minas, Magalhães Pinto, que seria a senha para colocar as tropas na rua.

Em vez de mandar o texto para ele antes, o governador entregou o manifesto à imprensa. E o conteúdo não era o que haviam combinado!

“Eu estava uma verdadeira fúria”, anotou. “Meu peito doía de rachar. Tive que por uma pílula de trinitrina embaixo da língua”

Olympio Mourão Filho, general de três estrelas, está em sua casa, em Juiz de Fora, onde há sete meses comanda a poderosa 4.a  Região Militar, uma das principais forças terrestres do Exército brasileiro. Está mesmo descontrolado:

“Idiotas. O chefe militar sou eu. Magalhães não terá desculpa perante a História…e o Guedes ( general Carlos Luís Guedes, comandante em Belo Horizonte), um falastrão vaidoso que aceitou um papel triste… Fizeram isso, bancando os heróis porque sabiam que eu era a própria revolução. Do contrário não se atreveriam a dar um passo irresponsável, arriscando uma revolução tão bem planejada, num momento de vaidade”

Depois da explosão, acalma-se:.

“Acendi o cachimbo e pensei: não estou sentindo nada e, no entanto, em poucas horas deflagrarei um movimento que poderá ser vencido porque sai pela madrugada e terá que parar no caminho.  Não faz mal…”

Em seu plano original, Mourão previa sair no início da noite, com 2.300 homens, para chegar ao Rio de Janeiro antes de clarear o dia e tomar de surpresa o prédio do Ministério da Guerra e o Palácio das Laranjeiras, onde se encontrava o presidente João Goulart.

Há uma semana “estava pronto”, mas vinha sendo retardado pelas manobras do governador Magalhães que, mineiramente, temia se envolver numa aventura.

Mourão ainda fazia anotações em seu diário, quando tocou a campainha de sua casa. Eram dois emissários do governador.

Vinham dizer que Magalhães já havia “dado o passo”, Minas se levantara contra Goulart.  Com aquele manifesto ambíguo?

Impaciente, ele os despacha rapidamente e volta ao diário, sente que estão lhe passando a perna:

“Vou partir para a luta às cinco da manhã…  Ninguém me deterá. Morrerei lutando. Nosso sangue impedirá a escravização do Brasil. Por consequência seremos, em última análise, vitoriosos ! E o mais curioso de tudo isto é que, passada a raiva (já estou normal, bebi água e café) não sinto nada, nem medo, nem coragem, nem entusiasmo, nem tristeza, nem alegria. Estou neutro”

Anotou alguns nomes num papel e, quando o relógio marcou cinco horas, chamou a telefonista de plantão na central de Juiz de Fora: “Quero prioridade absoluta e rápida para as ligações que vou pedir. Estou mandando a PM ocupar a Estação e a senhorita não diga palavra a ninguém”.

Considerou-se em ação: “Eu já havia desencadeado a Operação Silêncio”, anotou.

No primeiro telefonema tentou alcançar o coronel Everaldo Silva, que estava de prontidão no QG…”O telefone estava enquiçado. Tõcou então para o  major Cúrcio e mandou desencadear a “Operação Popeye”, o plano militar que ele, Mourão, havia traçado e ao qual batizara com o apelido que ganhara no quartel, pelo uso constante do cachimbo.

Em seguida,  convocou os coronéis Jaime Portela e Ramiro Gonçalves para que se apresentassem imediatamente no quartel (nenhum dos dois apareceu; Mourão foi encontrá-los dois dias depois, quando chegou ao Rio, no gabinete do general Costa e Silva, que já havia assumido o comando militar do levante).

A seguir,  ligou para o almirante Silvio Heck, comandante da Marinha: disse que estava partindo em direção ao Rio, para depor o presidente.

Em seguida alcançou o deputado Armando Falcão , para que avisasse Carlos Lacerda,  governador da Guanabara,  o mais notório inimigo do  governo Goulart.

Falcão,  astuto conspirador,  ligou para o general Castello Branco, que era o líder militar da insurreição e que evitara sempre se envolver com Mourão.

Castello, que não tinha tropas, tentou falar com Amaury Kruel, o comandante do II Exército, a maior força  militar do país. “Isso não passa de uma quartelada do Mourão, não entro nessa”, disse Kruel, quando foi alcançado por emissários.

Nesse meio tempo, Castello recebeu uma ligação do general Antonio Carlos Muricy, “conspirador tonitroante”, mas sem comando.

Muricy diz que foi chamado a Minas por Mourão, que está rebelado. Castello aconselha que vá “para prevenir qualquer bobagem”.

Enquanto isso, Mourão segue anunciando o golpe por telefone. Ao final de sua saraivada de chamadas,  fez questão  de registrar que “estava de pijama e roupão de seda vermelho”.

E  não esconde o  “orgulho pela originalidade”:

“Creio ter sido o único homem no mundo (pelo menos no Brasil) que desencadeou uma revolução de pijama”.

Subiu um lance de escada até o quarto onde estava seu amigo Antonio Neder, “que dormia como um santo”. Gritou:  “Acabo de revoltar a  4a Divisão de Infantaria e a  4ª Região Militar”.

O amigo “entre espantado e incrédulo”, perguntou: “Você agiu certo? Tem elementos seguros?”.

Mourão responde: “Vocês, paisanos, não entendem disso”. Eu estou agindo  certo, pode crer”.  Na verdade não tinha certeza de nada, nem mesmo se conseguiria tirar suas tropas do quartel.

Entrou no banheiro,  fez a barba e leu alguns salmos da Bíblia, como fazia todos os dias. Estava aberta no versículo 37, o Salmo de David : “A prosperidade dos pecadores acaba e somente os justos serão felizes”.

Leu e transcreveu em seu diário o salmo  inteiro:

“Não te indignes por causa dos malfeitores , nem tenhas inveja  dos que obram em iniquidade. Por que cedo serão  ceifados como erva e murcharão como a verdura. Confia no senhor e faze o bem: habitarás na terra, e verdadeiramente serás alimentado. Deixa a ira e abandona o furor, não de indignes para fazer o mal”.

A leitura da Bíblia remete o general à rua doutor Bozzano, em Santa Maria, 1522, onde morava em março de em 1962, onde tomou sua decisão de impedir a tomada do Brasil pelo “comunismo de Brizola”.

Ele vinha contando os dias: foram dois anos dois meses e 23 dias desde o início de sua conspiração, em Santa Maria, até ali naquele banheiro de onde ia partir para derrubar o governo.

“Eu era um homem realizado e feliz. Não pude deixar de ajoelhar-me no banheiro e agradeci a Deus a minha felicidade, havia chegado a hora de jogar a carreira e a vida pelo Brasil!”

Entrou no chuveiro, banhou-se calmamente. Só então vestiu o uniforme de campanha e foi tomar café com Maria, sua mulher (“Não consigo me lembrar se o Neder tomou café conosco”, diz ele nos registros que fez dias depois).

A essa altura a notícia de um golpe militar se espalhava rapidamente, mas o comandante  do levante ainda não saíra de casa.

“A insurreição estava envolta numa nuvem que se parecia ora com uma quartelada sem futuro ora com uma tempestade de boatos”(Gaspari).

***

O fechamento do aeroporto de Brasilia pouco depois das nove horas da manhã do dia 31, confirmou a boataria. O governo acionava seu dispositivo de segurança para conter um golpe.

Por volta das dez horas, ainda sem saber direito o que realmente estava acontecendo, o general Castello Branco, saiu de seu apartamento, em Ipanema, no Rio.

Foi  para o Ministério da Guerra,  no centro, onde tinha seu gabinete de trabalho, no sexto andar.  De lá ainda insistiu com o general Carlos Luís Guedes, comandante em  Belo Horizonte,  e o governados Magalhães Pinto para que detivessem  Mourão. “Senão voltarem agora serão derrotados”.

Guedes, depois em suas memórias, tentou associar-se à iniciativa de Mourão, dizendo que àquela hora também já estava rebelado, mas a verdade é que até aquele momento Mourão estava sozinho, e  assim continuaria um bom tempo.

Guedes naquelas alturas ainda  tentava saber se os americanos estavam dispostos a ajudar imediatamente com “blindados, armamentos leves e pesados , munições, combustíveis, aparelhagens de comunicações…”.

Para mais tarde, informou, precisaria de equipamento para  50 mil homens!

Ao meio dia, já se movimentavam tropas do governo para atacar Mourão.

“Na avenida Brasil principal saída do Rio e caminho para Juiz de Fora, marchavam duas colunas de caminhões.  Numa iam 25 carros cheios de soldados, rebocando canhões de 120 mm…Noutra, em  22 carros ia o Regimento Sampaio, o melhor contingente de infantaria da Vila Militar. De Petrópolis, a meio caminho entre o Rio e Mourão, partira o  1º.Batalhão de Caçadores” (Gaspari).

Fardado, de capacete, Mourão foi fotografado no início da tarde, no QG da 4ª. Divisão de Infantaria.

No Rio correu o boato que o dispositivo militar do governo, mandara prender Castello Branco.  Sessenta oficiais da Escola Militar da Praia Vermelha formaram um comando para protegê-lo. Os expedicionários instalaram-se no sexto andar, em torno de Castello  .

“Desligaram os elevadores principais e bloquearam as passagens de quatro pavimentos. A revolta controlava os corredores do quinto ao oitavo andar, enquanto o governo funcionava no resto”.

No décimo andar,  o gabinete do ministro da Guerra estava vazio, ele estava hospitalizado.

Quando os carros de choque da Polícia do Exército chegaram  para desalojar os revoltosos, eles já estavam fora.

Castello, acompanhado do  general Ernesto Geisel  já estavam alojados num “aparelho”, comandando  no golpe.

Chamado por Mourão, o general Antonio Carlos Muricy fora  incumbido de chefiar a vanguarda da tropa que desceria em direção ao Rio.

Ao inspecionar os homens de que dispunha, Muricy  percebeu que mais da metade eram recrutas e a munição dava para poucas horas.

Enquanto isso, Mourão enfrentava dificuldades para levar as tropas à rua. O comandante do  10º Regimento de Infantaria,  coronel Clóvis Calvão não apoiava o levante.  Mourão contornou o impasse dando férias ao coronel, colocando um dos seus no lugar.

Dois outros coronéis e o comandante da Escola de Sargento de Três Corações, também rechaçaram a ordem de botar a tropa na rua e foram para casa.

Nada disso influiu no apetite do general. A uma da tarde, ele foi para casa almoçar e não dispensou sequer a sesta.

“Tinham-se passado oito horas  desde o momento em que se considerara insurreto. Salvo os disparos telefônicos e a movimentação de um pequeno esquadrão de reconhecimento que avançara algumas dezenas de quilômetros, sua tropa continuava onde sempre estivera: em Juiz de Fora.” (Gaspari)

O embaixador americano soube da rebelião a essa hora.  Imediatamente avisou o Departamento de Estado: “(…) pode ser a última hora para apoiar uma ação contra Goulart”.

“Ele não é bem visto no Exército e provavelmente não liderará uma conspiração contra o governo, em parte porque não tem muitos seguidores. É visto como uma pessoa que fala mais do que pode fazer”.(Documento do Departamento de Estado ao secretário Dean Rusk de 31 de março).

O general Mourão ainda é um personagem enigmático e seu papel no golpe não está bem dimensionado.  Ele se considerava o mentor, o realizador de tudo, o que certamente não foi.

Em janeiro de 1962, quando ele se declarou em conspiração,  o movimento para depor o governo  já funcionava a pleno no Rio de Janeiro. Ele mesmo tentou se integrar  ao grande movimento conspiratório, mas por  se considera “o comandante” e por ser indiscreto em seus atos e palavras, foi sendo afastado. Ele mesmo registra isso em seu diário.

Para o historiador Hélio Silva, Mourão era um “homem bom, sofredor, pitoresco, capaz de assomos de cólera”.

Em suas memórias, Mourão Filho diz que foi “acordado” para o perigo comunista num jantar oferecido ao governador Leonel Brizola, quando este falou de seus planos a ele e ao general Osvino Ferreira Alves, comandante do I Exército, brizolista, que passava suas férias em Santa Maria, em 1962.

Brizola havia frustrado a primeira tentativa de golpe com o movimento da “Legalidade”, um ano antes, e se preparava para disputar a sucessão de João Goulart.

Na versão de Mourão, o golpe foi contra Brizola, mais do que contra Jango,

*“Diário de um revolucionário”, Olympio Mourão Filho, L&PM Editores, 1978.

250 ANO DE PORTO ALEGRE: entenda o que se comemora no 26 de março

Foi a primeira boa notícia que os casais açorianos receberam em 20 anos de acampados à margem do Guaíba: no dia 26 de março de 1772, dom Antônio do Desterro, do bispado do Rio Janeiro, assinou decreto pastoral, transformando o Porto dos Casais em Freguesia de São Francisco das Chagas.

Desmembrado de Viamão, o povoado começaria finalmente a solucionar seus problemas: haveria instalação de serviços públicos, registro de nascimentos e óbitos, e a possibilidade de sonhar com a denominação de vila. Mas, acima de tudo, seria resolvida a questão da posse da terra. Por tudo isso, a alegria tomou conta do pequeno povoado de aproximadamente mil habitantes.

Esse salto foi o primeiro de uma série. Em 22 de maio, com a posse do padre José Gomes de Faria, a capela do Porto dos Casais virou sede de freguesia sem nunca ter sido curada, isto é, sem ter tido padre fixo. E, a 18 de janeiro de 1773, nova pastoral do bispo do Desterro substituiu a invocação de São Francisco do Porto dos Casais pela de Nossa Senhora da Madre de Deus de Porto Alegre, elevando o povoado à categoria de paróquia.

No Rio de Janeiro, José Marcelino de Figueiredo – substituído no governo do Continente do Rio Grande de São Pedro, em Viamão, pelo tenente-coronel Antônio da Veiga Andrade – guia lutando pela ideia de transformar o Porto dos Casais em vila e capital. Os livros garantem que foi ele quem convenceu o bispo e o vice-rei, Marquês de Lavradio, da importância estratégica e militar do povoado.

O certo é que, no dia 12 de julho de 1773, o governador Veiga Andrade recebe ordens do próprio vice-rei para iniciar o processo de desapropriação da sesmaria de Ignácio Francisco de Melo e demarcar os lotes de terra para os casais açorianos, reservando área para edificação da futura sede da freguesia.

Fonte: História Ilustrada de Porto Alegre

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