Desmonte do plano diretor de Porto Alegre começou há mais de três décadas: a cidade perdeu

O que está ocorrendo agora com o Plano Diretor de Porto Alegre é a culminância de um processo que começou há mais de três décadas.

Mais precisamente em 1987 e, ironicamente, num governo trabalhista, de  Alceu Collares, quando o setor imobiliário começou a se impor ao planejamento urbano.

Ironicamente, porque o Plano Diretor de Porto Alegre, pioneiro no Brasil, foi aprovado na gestão do prefeito trabalhista Leonel Brizola, e se tornou referência em termos de planejamento urbano até no exterior.

Os planejadores, uma geração de urbanistas gaúchos que alcançaram projeção nacional, tinham clareza da dinâmica das cidades, tanto que estabeleceram uma revisão a cada dez anos.

O Plano Diretor, concebido pelos urbanistas da Faculdade de Arquitetura da Ufrgs e chancelado por Brizola, foi aprovado em 1959.

Em 1964 veio  o golpe militar e vieram os prefeitos nomeados. O Plano resistiu, até por que dos quatro mandatos nomeados, dois foram ocupados por Guilherme Socias Villela, economista de grande sensibilidade para as questões urbanas.

Quando voltaram as eleições para prefeito, em 1986, elegeu-se Alceu Collares. O plano tinha quase 20 anos e não passara por uma revisão.  O setor imobiliário acumulara forças e os próprios planejadores reconheciam a necessidade de mudanças adaptativas a uma nova realidade.

Mas o que ocorreu no governo municipal de Collares não foi a revisão de um Plano Diretor da cidade.

O que ocorreu foi o início do desmonte da estrutura pública que garantia um planejamento urbano com alguma independência do setor que obtém seus lucros da venda do espaço urbano.

Os governos petistas (1988/2003) conseguiram conter a onda até por ali.  A revisão de 2009 já foi sob a égide do setor imobiliário.  A partir dali, as revisões foram sendo adiadas, enquanto leis especificas, como a do Centro Histórico e o Quarto Distrito,  iam detonando a ideia de um planejamento que estabelece regras tendo em vista a cidade como um todo.

As cidades são organismos vivos e se reinventam.  Mas colocar o desenvolvimento de uma capital como Porto Alegre sob domínio de um setor econômico, para o qual praticamente não há regras…

MPRS cumpre 139 ordens judiciais em sete municípios, incluindo bloqueio de bens e o afastamento do vice-prefeito e secretários de Santa Cruz do Sul

O Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado do Ministério Público do Rio Grande do Sul (GAECO/MPRS) realiza nesta terça-feira, dia 14 de novembro, a fase ostensiva da Operação Controle, que tem como foco da investigação a cidade de Santa Cruz do Sul. O objetivo é desarticular organização criminosa responsável por fraudes que causaram prejuízos que podem alcançar mais de R$ 47 milhões aos cofres públicos do município do Vale do Rio Pardo. A ação tem o apoio das Promotorias de Justiça do município e da Brigada Militar.

Estão sendo cumpridas 139 ordens judiciais contra os investigados. São 46 mandados de busca e apreensão, bloqueios de bens e valores no total de mais de R$ 47 milhões, pagamento de fianças de aproximadamente R$ 1,4 milhão, indisponibilidade de 28 veículos e três embarcações, sequestro de 10 imóveis, afastamento das funções públicas de 10 agentes e proibição a seis empresas de contratarem com o Poder Público, entre outras medidas.

Os mandados de busca e apreensão também são cumpridos em outras seis cidades: Lajeado, Estrela, Vera Cruz, Venâncio Aires, Mato Leitão e Santa Clara do Sul. Foi determinado o afastamento de cinco integrantes do alto escalão da Prefeitura de Santa Cruz do Sul – incluindo o vice-prefeito – e servidores municipais. Todos são suspeitos de envolvimento nos crimes e por isso haverá restrições patrimoniais aos investigados por fraudes em licitações, peculatos – desvios de valores públicos realizados por funcionários públicos – e lavagem de dinheiro.

Uma das irregularidades envolveu a reforma e pavimentação do Autódromo Internacional de Santa Cruz do Sul, obra que, além de fraudada e superfaturada, foi executada com má qualidade, o que colocou em risco a segurança dos pilotos de etapa da Stock Car Brasil em novembro de 2022. No município, as ordens judiciais de buscas ocorrem em residências, empresas, sedes das secretarias e na Câmara de Vereadores. Os suspeitos são o vice-prefeito, que também ocupa uma secretaria, e quatro secretários, além de quatro servidores municipais, um vereador e cinco empresários e seus subordinados. Ainda, são investigadas seis empresas por envolvimento nas irregularidades.

Para o subprocurador-geral de Justiça para Assuntos Institucionais, Luciano Vaccaro, “investigar grupos criminosos, lavagem de dinheiro e desvio de verbas públicas é uma prioridade para nossa gestão no MPRS e para o GAECO. Com a fase ostensiva desta operação, envolvendo cumprimento de mandados de busca e afastamento de servidores públicos, nós estamos investigando indícios de que realmente havia a atuação de uma organização criminosa destinada ao desvio de dinheiro público na Prefeitura”.

ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA

O coordenador do GAECO, promotor de Justiça André Dal Molin, ressalta que dois núcleos distintos compõem esta organização criminosa. Conforme investigação do GAECO/Central, o núcleo político é chefiado por um vereador que tem ligação com algumas empresas ao atuar como advogado delas e ainda há os integrantes da Prefeitura de Santa Cruz do Sul que são investigados. A apuração, que iniciou em junho de 2022, detectou também a existência de dois núcleos empresariais, os quais se relacionavam com o núcleo político e contavam, por vezes, com apoio de um integrante de associação empresarial local.

A organização criminosa planejou, fraudou e direcionou licitações, bem como fez contratos de aluguéis de secretarias municipais em casa de festas e em empreendimento imobiliário de empresas investigadas, sem interesse público, com dispensa de licitação, valores com sobrepreço e prorrogações contratuais fraudulentas, sempre em favorecimento direto aos responsáveis pelos núcleos empresariais. Se não houvesse a intervenção do MPRS, nesta terça-feira, os prejuízos seriam ainda maiores ao erário.

FRAUDES

O promotor de Justiça João Beltrame, coordenador do 8° Núcleo do GAECO/Central, foi o responsável pela investigação, juntamente com os promotores de Justiça designados Flávio Passos e Érico Barin. João Beltrame detalhou que as fraudes comprovadas, que somam mais de R$ 47 milhões aos cofres públicos, estão relacionadas a várias obras e uma delas é uma reforma na pista do autódromo de Santa Cruz do Sul: “há indícios de possíveis fraudes e peculatos na reforma e pavimentação do autódromo internacional, com direcionamento de licitação, superfaturamento e depois ainda com aditivos contratuais injustificáveis que elevaram o valor contratual em mais de R$ 3 milhões. Além disso, a obra foi mal planejada e mal executada, colocando em risco a segurança dos pilotos da Stock Car em novembro do ano passado”.

O promotor ainda diz que os suspeitos, mesmo cientes de que o material era de baixa qualidade e inadequado a um autódromo, por ganância, optaram por utilizá-lo. Em consequência, durante a etapa da Stock Car no final de 2022, o asfalto esfarelou e levantou blocos, motivando reclamações dos pilotos na época. A repercussão foi nacional, já que as atividades criminosas criaram riscos de acidentes graves aos pilotos. Já o promotor de Justiça Érico Barin, ressaltou que “há indícios de que na nova obra de reforma do autódromo, cujo edital de licitação já foi lançado, a organização criminosa tentou obter ilegalmente de valores públicos. Neste caso, uma das empresas investigadas elaborou novamente um projeto técnico e definiu os valores da obra – orçada em mais de R$ 8 milhões – e inseriu no edital uma cláusula restritiva de concorrência para o fim de direcionar o certame.”

Caso semelhante ocorreu na duplicação de trecho municipalizado da BR-471, em Santa Cruz do Sul, como referiu o promotor de Justiça Flávio Passos. “De acordo com as provas coletadas na investigação, a mesma empresa investigada fez todos os projetos técnicos e definiu os valores da obra, fraudando e direcionando a licitação, cujo valor já ultrapassa R$ 21 milhões, após aditivos igualmente fraudulentos. Além disso, as investigações demonstraram que o grupo suspeito segue atuando no município, visto que já foca em mais uma nova obra a ser licitada para a construção de ciclovia na Avenida Leo Kraether. Os projetos dessa obra estão sendo, mais uma vez, elaborados e avaliados por engenheiros da mesma empresa suspeita, juntamente com a contratação de uma terceira, usada como fachada na intermediação de integrante de associação empresarial local”.

Ainda segundo o MPRS, as investigações comprovaram a diversidade de ações da organização criminosa, que também atuou em fraudes na contratação direta, mediante dispensa de licitações, de um prédio de luxo usado como casa de festas e de salas comerciais de empresas suspeitas para locações de secretarias municipais, sem qualquer necessidade de interesse público e com valores acima do normal no mercado. Houve também direcionamento nas licitações.

A ação contou com o apoio dos promotores de Justiça Mauro Rochenbach, Gerson Daiello Moreira, Rogério Meirelles Caldas, Manoel Antunes, Diego Pessi, Camilo Vargas Santana, Maristela Schneider, Heitor Stolf Júnior e Rogério Fava Santos, além de 148 agentes da Brigada Militar e 71 agentes adidos e servidores do MPRS atuantes no GAECO, Núcleo de Inteligência do Ministério Público (NIMP), Assessoria de Segurança Institucional (ASI), Promotoria Especializada Criminal, Promotoria de Defesa do Patrimônio Público, Promotoria de Defesa do Consumidor e Promotoria de Santa Cruz do Sul. O total passa de 230 envolvidos na Operação Controle.

CPI conclui que Bolsonaro liderou a tentativa de golpe no 8 de janeiro

A CPMI  que apurou a responsabilidade pelo atos antidemocráticos do 8 de Janeiro, em Brasilia, encerrou seus trabalhos nesta terça-feira, 17/10, depois de quase cinco meses de trabalho.

A relatora senadora Eliziane Gama (PSD-MA), pediu o indiciamento de 61 pessoas, à frente o ex-presidente Jair Bolsonaro.

Entre os crimes listados pela relatora, Bolsonaro deve responder por associação criminosa, abolição violenta do Estado democrático de direito e golpe de Estado.

O documento aponta ainda integrantes militares do governo Bolsonaro próximos ao ex-presidente, como o ex-ministro da Casa Civil e da Defesa, general Walter Braga Netto; o ex-ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno; o ex-ministro da Secretaria-Geral da Presidência, general Luiz Eduardo Ramos, e o ex-ajudante de ordens, tenente-coronel Mauro Cid.

Dois oposicionistas apresentaram votos em separado apontando omissão do governo federal para impedir os ataques.

Eles pedem o indiciamento do presidente Lula e citam a falta de provas que sustentem a criminalização de Bolsonaro.

Um pedido de vista transferiu a discussão e votação do relatório final para esta quarta-feira (18), a partir das 9h.

Com mais de 1,3 mil páginas, o relatório da senadora Eliziane concluiu que o roteiro do ataque golpista foi planejado e orquestrado, com a manipulação de massas por meio do discurso de ódio, com o objetivo de dividir cada vez mais a população e com a tentativa de desacreditar as instituições democráticas e o sistema eleitoral para, assim, promover a tomada de poder, no 8 de janeiro.

A construção golpista, conforme a senadora, não se apoiou em apenas um pilar, mas foi, segundo ela, resultado de diversos elementos construtivos, com o auxílio de vários agentes que começaram a atuar muito antes da data do ataque.

Para a relatora, “os golpes modernos, à esquerda e à direita, não usam tanques, cabos ou soldados. O golpe deve fazer uso controlado da violência. É preciso, sobretudo, que o golpe não pareça golpe”.

— Começam por uma guerra psicológica, à base de mentiras, de campanhas difamatórias, da disseminação do medo, da fabricação do ódio. É tanta repetição, repetição, repetição, potencializada pelas redes sociais, pelo ecossistema digital, que muitos perdem o parâmetro da realidade. O golpe avança pela apropriação dos símbolos nacionais. O golpe continua pelas tentativas de captura ideológica das forças de segurança. Por isso é importante atacar as instituições, desacreditar o processo eleitoral — afirmou a senadora.

O relatório recomenda ainda a criação do Memorial em Homenagem à Democracia, a ser instalado na parte externa do Senado Federal, reforçando que o Brasil é um Estado democrático de direito e que, no dia 8 de janeiro de 2023, a democracia foi atacada.

Indiciamentos e crimes
Entre os crimes listados pela relatora, Bolsonaro deve responder por associação criminosa, abolição violenta do Estado democrático de direito e golpe de Estado.

Também devem responder criminalmente, segundo a relatora, integrantes de círculo próximo ao ex-presidente da República.

Também estão listados o ex-ministro da Justiça e ex-Secretário de Segurança Pública do Distrito Federal Anderson Torres, e o ex-diretor da Polícia Rodoviária Federal Silvinei Vasques “por aderir subjetivamente às condutas criminosas de Jair Messias Bolsonaro e demais indivíduos em seu entorno, colaborando decisivamente para o desfecho dos atos do dia 8 de janeiro de 2023”, afirma Eliziane em seu relatório.

Pedidos de indiciamento
-Jair Messias Bolsonaro – ex-presidente da República
-Walter Souza Braga Netto – General do Exército, ex-ministro da Defesa, candidato a vice na chapa de Jair Bolsonaro na eleição de 2022
-Augusto Heleno Ribeiro Pereira – General do Exército, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI)
-Luiz Eduardo Ramos Baptista Pereira – General do Exército, ex-ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, da Secretaria de Governo e da Casa Civil
-Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira – General do Exército, ex-ministro da Defesa
-Almir Garnier Santos – Almirante de esquadra, ex-comandante da Marinha
-Marco Antônio Freire Gomes – General do Exército, ex-comandante-geral do Exército
-Mauro Cesar Barbosa Cid – Tenente-coronel do Exército, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro
-Luís Marcos dos Reis – Sargento do Exército, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro
-Ailton Gonçalves Moraes Barros – Ex-major do Exército
-Antônio Elcio Franco Filho – Coronel do Exército
-Jean Lawand Júnior – Coronel do Exército
-Anderson Gustavo Torres – Ex-ministro da Justiça, ex-secretário de Segurança Pública do DF
-Marília Ferreira de Alencar – Ex-diretora de inteligência do Ministério da Justiça
-Silvinei Vasques – Ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal
-Filipe G. Martins – Ex-assessor-especial para Assuntos Internacionais da Presidência da República
-Alexandre Carlos de Souza Silva – policial rodoviário federal
-Marcelo de Ávila – policial rodoviário federal
-Maurício Junot – sócio de empresas com contratos com a PRF
-Carla Zambelli – Deputada federal
-Marcelo Costa Câmara – Coronel do Exército, ex-ajudante de ordens da Presidência da República
-Ridauto Lúcio Fernandes – General da reserva do Exército
-Meyer Nigri – empresário e difusor de conteúdos no WhatsApp
Agentes públicos do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) no dia 8 de janeiro de 2023:

-General do Exército Carlos José Russo Assumpção Penteado
-General do Exército Carlos Feitosa Rodrigues
-Coronel do Exército Wanderli Baptista da Silva Junior
-Coronel do Exército André Luiz Furtado Garcia
-Tenente-coronel do Exército Alex Marcos Barbosa Santos
-Major do Exército José Eduardo Natale de Paula Pereira
-Sargento do Exército Laércio da Costa Júnior
-Coronel do Exército Alexandre Santos de Amorim
-Tenente-coronel da PMDF Jader Silva Santos
Agentes públicos da PMDF

-Coronel da PMDF Fábio Augusto Vieira
-Coronel da PMDF Klepter Rosa Gonçalves
-Coronel da PMDF Jorge Eduardo Barreto Naime
-Coronel da PMDF Paulo José Ferreira de Sousa Bezerra
-Coronel da PMDF Marcelo Casimiro Vasconcelos Rodrigues
-Major da PMDF Flávio Silvestre de Alencar
-Tenente da PMDF Rafael Pereira Martins
Difusores de conteúdo falso nas redes sociais:

-Tércio Arnaud Tomaz – Ex-assessor especial no Palácio do Planalto
-Fernando Nascimento Pessoa
-José Matheus Sales Gomes – Ex-assessor especial no Palácio do Planalto
Financiadores dos atos, segundo a relatora

-Adauto Lúcio de Mesquita – empresário
-Joveci Xavier de Andrade – empresário
-Ricardo Pereira Cunha – integrante do grupo Direita Xinguara (PA)
-Mauriro Soares de Jesus – empresário
-Enric Juvenal da Costa Laureano – consultor da Associação Nacional do Ouro
Financiadores do Movimento Brasil Verde e Amarelo

-Antônio Galvan – sojicultor
-Jefferson da Rocha – advogado
-Vitor Geraldo Gaiardo – sojicultor
-Humberto Falcão – sojicultor
-Luciano Jayme Guimarães – sojicultor
-José Alípio Fernandes da Silveira – sojicultor
-Valdir Edemar Fries – sojicultor
-Júlio Augusto Gomes Nunes – comerciante
-Joel Ragagnin – sojicultor
-Lucas Costa Beber – sojicultor
-Alan Juliani – sojicultor
Indiciados pela tentativa de explosão de bomba:

-George Washington de Oliveira Sousa
-Alan Diego dos Santos Rodrigues
-Wellington Macedo de Souza
(Com informações da Agência Senado)

Manuel Domingos traz meio século de reflexão sobre os militares

Manuel Domingos Neto, autor do livro “O que fazer com o militar”, participa hoje de debate no auditório da Faculdade de Economia da UFRGS, às 19hs, junto com Tatiana Vargas Maia, professora de Relações Internacionais, e de Eduardo Munhoz Svartman, professor de Ciência Política e Estudos Estratégicos, ambos da UFRGS. O mote do debate é Defesa Nacional e Amizade com os Vizinhos.

Manuel Domingos Neto é doutor em História pela Universidade de Paris. Há mais de cinquenta anos se dedica à temática militar. Foi professor da Universidade Federal do Ceará, da Universidade Federal Fluminense e presidente da Associação Brasileira de Estudos de Defesa-ABED.

O livro, destinado aos leitores não familiarizados com a temática, aborda aspectos de alta complexidade em texto de fácil leitura. Será lançado em Porto Alegre no dia 9/10, a partir das 19h, quando o autor conversará sobre o tema com José Genoíno, que foi deputado constituinte e assessor de ministros da Defesa. Será  no auditório do Sindicato dos Bancários.

Segundo o autor, o Estado precisa definir o papel das corporações militares, hoje envolvidas em múltiplas tarefas, em prejuízo do preparo para enfrentar agressores estrangeiros. Sem uma reforma militar, seriam vãos novos investimentos em Defesa.
Domingos considera o militar limitado para formular e conduzir a Defesa do Brasil. Sustenta que, prevalecendo o ponto de vista castrense neste domínio, a democracia estará sob risco e o país persistirá exposto à ganância estrangeira. Não será voz altiva no cenário internacional e comprometerá o desenvolvimento socioeconômico.
Apenas o poder político detém legitimidade para definir e conduzir a Defesa, afirma Manuel Domingos. Assinala, entretanto, a necessidade de superar o despreparo técnico do aparato estatal e a indisposição para quebrar a rotina histórica consagradora do mando militar.
Dentre as numerosas proposições que enumera, destacam-se a eliminação do conceito de “inimigo interno”, a interrupção da dependência em armas e equipamentos de potências imperialistas, a redução de tropas e sua redistribuição espacial em favor de maior capacidade dissuasória, a revisão do serviço militar, a prioridade da força aeronaval em relação à força terrestre, a reforma da carreira militar, o estreitamento da cooperação em Defesa com os países sul-americanos e a interrupção da ingerência militar no sistema de Segurança Pública.
Depois deste livro, as críticas ao ativismo político do militar não ficarão mais restritas à sua participação no governo e à defasagem dos currículos das academias militares.
O autor refuta a ideia de que a pura e simples modernização das corporações evitaria o ativismo político, e aponta a classificação dos oficiais como “golpistas” e “legalistas” como simplificação enganosa.
“O que fazer com o militar” demonstra que os desafios da Defesa Nacional e mudanças nas corporações transcendem à capacidade dos governantes: passa pela disposição da sociedade e do Estado de livrar-se da subalternidade ao estrangeiro poderoso.

O livro poderá ser adquirido durante os eventos ou diretamente na editora::  http://gabinetedeleitura.com

Descaso com o patrimônio histórico está escancarado na rua Duque de Caxias

A rua Duque de Caxias, cuja história se confunde com as origens de Porto Alegre, vai “ganhar” um edifício de 41 andares (134 metros de altura) no seu ponto mais alto.

Pretende ser o primeiro de uma série de “prédios icônicos” que irão moldar  a nova face urbana da cidade, seguindo os padrões globais de verticalização.

O impacto no coração do centro histórico não está devidamente medido. Simulações indicam que o prédio projetará sombra sobre a matriz, o Palácio Piratini e até no monumento a Julio de Castilhos, o Patriarca.

Simulação em 3D feita pelo IAB

Além da pressão na infraestutura e no trânsito, o impacto visual: o espigão vai desfigurar imóveis tombados, como são as casas do Museu Julio de Castilhos.

O projeto, no entanto, é coerente com o que vem acontecendo há muito tempo.

O descaso com o patrimônio histórico está escancarado ao longo de toda a Duque de Caxias, uma das três ruas traçadas pelo capitão  Montanha, o engenheiro militar que definiu o perímetro original do povoado, em agosto de  1773,  há 250 anos, portanto.

A população de Porto Alegre ainda não chegava a mil moradores.

Rua da Praia (Andradas), a rua do Cotovelo (Riachuelo) e, no alto, a rua Formosa (atual Duque de Caxias), três paralelas. Foram as  vias que orientaram a ocupação da cidade, entre as águas  e o espigão, a partir do núcleo original junto à Praia do Arsenal.

Representação esquemática das três primeiras ruas de Porto Alegre: Rua da Praia (Andradas), Rua do Cotovelo (Riachuelo) e Rua Formosa (depois Rua da |greja e atual Duque de Caxias)

Com a construção da primeira matriz no seu ponto mais alto, a rua Formosa passou a ser a “rua da Igreja”.

Quando visitou Porto Alegre, em 1820, o botânico francês, Saint’Hilaire, registrou em seu famoso diário: “Uma das três grandes ruas, chamada rua da Igreja , estende-se sobre a crista da colina. É aí que ficam os três principais edifícios da cidade, o Palácio, a Igreja Paroquial e o Palácio da Junta (que depois foi Assembleia). São construídos alinhados e voltados para noroeste. Na outra face da rua, em frente não existem edifícios, mas tão somente um muro de arrimo, a fim de que não seja prejudicada a linda vista que daí se descortina”.

Numa sessão no dia 29 de dezembro de 1869,  a Câmara Municipal mudou a denominação de rua da Igreja para Duque de Caxias, homenagem ao general que pacificou a Província, foi governador e senador pelo Rio Grande do Sul. Sua gestão, depois da Revolução Farroupilha, foi de reconstrução e de muitas obras em Porto Alegre, inclusive o ajardinamento da Praça da Matriz e outras duas praças na rua Duque de Caxias, “que concorreram para embelezá-la”.

Em 1892 possuía 317 prédios, sendo 55 sobrados e 40 assobradados. Foi uma das primeiras onde circulou um bonde elétrico em 1909 e o bonde “Duque” fez parte do folclore urbano de Porto Alegre.

No início do século 20, a Duque de Caxias tornou-se o endereço da elite política e econômica do Estado, era a rua do poder. É dessa época o palacete dos Chaves Barcellos, a 100 metros do Palácio Piratini,  projetado por Theo Wiedersphan.

Palacete dos Chaves Barcellos: tombado e abandonado | Foto: Ramiro Sanchez/@outroangulo

Eram quatro casarões pertencentes ao clã na Duque — duas delas deram lugar a prédios, uma foi demolida, virou estacionamento.

A que resiste, na esquina da Duque com a João Manoel, desde 2004 é patrimônio histórico do município, em estado de abandono denunciado na imprensa já em 1990.

Em setembro de  2023, a rua Duque de Caxias  tem 23 imóveis tombados ou inventariados pelo patrimônio público, em âmbito federal, estadual e municipal.

Dois terços deles abandonados, quando não depredados e irrecuperáveis.

| Foto: Ramiro Sanchez/@outroangulofoto

 

Fora a Igreja Matriz e os prédios principais do poder público, como o Palácio Piratini, a antiga Assembleia (que está sendo restaurada), o quadro é de abandono total.

Um visitante que percorra a pé os dois quilômetros e pouco da rua Duque de Caxias não terá a menor ideia dos 250 anos de história que ela encerra.  O que ele perceberá chocado é o descaso com o pouco que resta desta memória.

(Com informações do Guia Histórico de Porto Alegre, de Sérgio da Costa Franco)